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Ex3mo Signo: “Podem contar com um dos melhores álbuns de rap de sempre”

É um dos rappers angolanos mais conceituados, e começou a escrever bem cedo. Os planos em criança não passavam pelo rap mas, apesar da infância difícil, aos 14 anos já treinava freestyles. “Lilito” é o tema que destaca, pois retrata a sua trajectória e as dificuldades que teve de ultrapassar para chegar ao trono. Conhecido como Imperador, lançará brevemente o seu álbum a solo, o “Opinião Pública”, que descreve como a jóia da sua coroa, e o primeiro de muitos que pretende lançar. Para Ex3mo Signo ser rapper é narrar vivências e aconselha aos jovens, que sonham com esta carreira, cultivarem-se culturalmente, “porque um bom rapper precisa disso”, e transparência no que escrevem, “pois tudo o que escrevem acaba por influenciar a vida de alguém”.

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Ex3mo Signo, em primeiro lugar fale-me de si… Onde nasceu e cresceu, fale um pouco sobre a sua infância…

Eu nasci no Ingombota, Kinaxixi, mais propriamente no prédio da Cuca, mas aos três meses de vida fui viver para casa dos meus avós no Rangel, e lá cresci. Fui para lá por motivos que já expliquei numa música minha, da última mixtape “Força da Natureza Vol. 2 – O Tufão”, música intitulada “Litito”.

A minha infância não foi muito fácil, pois fui criado pelos meus avós, e a minha avó não trabalhava, era doméstica, e cuidava dos 12 netos que tinha em casa. O meu avô era motorista. Fome não passávamos, mas também não tínhamos luxos. Imagina o que era dois senhores velhinhos cuidarem de 12 netinhos pequeninos… Foi um pouco complicado… E a partir do momento em que o meu avô morreu, já eu tinha 18 anos feitos, foi ainda mais complicado, porque isso começou a conduzir-me para outros caminhos, começou a mostrar-me a página mais negra e o lado mais negro da minha vida. Mas foi assim…

Quando surgiu a paixão pela música?

A paixão pela música surgiu muito cedo na minha vida, porque para já eu venho de uma família de cantores e músicos. O meu contacto mais directo com a música era com o meu irmão mais velho, que também é cantor e muito conhecido cá em Angola. É um cantor de um estilo totalmente diferente do meu, que é o romântico, ele faz o estilo sertanejo, chama-se Kelly Silva, e desde muito pequeno eu acompanhei o desenvolvimento do talento dele. Ele passava a vida a cantar em todo o lado, e como irmão menor, estávamos constantemente juntos e eu acompanhava a escrita dele, aprendi e desenvolvi a minha escrita e inclusive ajudando-o a compor, e até gostava. Cantava muito com ele e apesar dele querer fazer uma dupla comigo, eu não me identificava com aquele estilo.

Com cerca de 10 anos comecei a ouvir rap, mas achava que era uma música de bandidos, para marginais, não tinha noção do que era realmente o rap. Mas os meus amigos, do mesmo bairro, com quem cresci, começaram a fazer playback dos SSP, e na altura eu comecei a ouvir Black Company. Aos 12 anos fui ouvindo outros grupos e artistas da nossa praça, de Angola e Portugal, e comecei a fazer playback dos Black Company, em que eu interpretava o Bambino, para mim um dos melhores rappers de sempre. A dada altura fartei-me de fazer playbacks e resolvi começar a escrever as minhas próprias letras, isso já com 14 ou 15 anos. Comecei a treinar freestyles, e tornei-me um expert, tanto que participei em vários concursos. Participei em centenas de rodas de freestyles e batalhas, das quais perdi algumas e venci a maioria.

Porquê o hip hop? Era um sonho de criança ser rapper?

No princípio não. No princípio gostava de música romântica, que tocasse mais a alma, e eu era um pouco sensível. Foi enrijecendo à medida que fui crescendo, e com as quedas da vida fui vendo que as coisas não eram bem assim, não eram um mar de rosas, e comecei a ouvir música alternativa, outros estilos, e identifiquei-me muito com o rap por ser um estilo de música street. Naquela altura já andava sempre com os amigos por todo o lado, e eu ouvia as letras e era o que eu vivia e gostava. Mas o plano em miúdo era ser advogado ou piloto ou marinheiro… (risos). Hoje em dia vejo o hip hop como um modo de vida, uma cultura, e vivo dentro daquilo que são os padrões, vivo do rap e dos seus derivados.

Quem são as suas influências e os seus ídolos na música?

As minhas influências no início eram SSP, Black Company e Boss AC. Não tinha como não ter esses ícones da música como minhas referências e meus ídolos, e tentava espelhar-me neles. À medida que fui crescendo e aprendendo mais sobre a cultura hip hop e sobre o rap, fui aumentando o meu leque de artistas que admirava e comecei a ouvir Dealema, Vírus, Valete e Sam The Kid, grupos portugueses, e de Angola ouvia MCK, Coligação Periférica, entre outros. Fui crescendo e amadurecendo, e também ouvia artistas americanos como Snoop Dog, Xzibit, Dr. Dre e Eminem. Hoje em dia, aqui em Angola ouço e respeito muito Abdiel, Ready Neutro, WS, Francis, que é actualmente uma das figuras incontornáveis do rap nacional, Kool Klever, MCK, Shankara, Cfkappa e Pai Grande O Poeta. Também gosto de ouvir Duas Caras, Azagaia, Hernâni da Silva, de Moçambique. Não me inspiro neles, mas ouço bom rap vindo deles, e acabam por ser uma motivação para mim. Mas como inspiração mesmo apontaria Jay Z, Kendrick Lamar, Drake, Eminem, Royce da 5'9" e Lil Wayne.

Ainda se lembra quando pisou um palco pela primeira vez? O que sentiu?

A primeira vez que pisei um palco foi no meu bairro, no município do Rangel, no antigo Cine Ngola. Era um local onde se faziam muitas festas, shows, actividades recreativas de vários tipos, e eu subi ao palco para responder a um beef. Na altura eu tinha beef’s com um rapper que hoje respeito muito e admiro, Bob da Rage Sense. Ele era do bairro Popular, mas era de um grupo rival, e subiu ao palco e mandou punchlines para todos os artistas do município do Rangel, desafiando-nos para subir ao palco para uma batalha. Ele fez aquilo uma ou duas semanas antes de eu subir ao palco, e eu nem estava no show mas recebi o recado e não gostei. Então subimos ao palco, com toda a minha tropa, a Defensive Line, eramos muitos, mais de 200, e dissemos para subirem e escolherem um para batalhar connosco e eles não subiram. Então escolhemos dois ou três e fomos respondendo quatros frases cada um, de cada vez, e a casa pegou fogo! Naquela altura eu subi de raiva, e acho que na verdade as coisas que mais me motivam a fazer rap, são os sentimentos de tristeza e de raiva ou revolta. Mas foi muito bom e a partir daí viciei e só queria shows.

O que senti foi realização, na altura. Acho que foi mais um level, mais um degrau. Eu queria ser reconhecido como artista, e estava com sede de sucesso e de reconhecimento, mesmo como um MC de batalhas, não deixava de ser um artista. Se bem que eu não tinha uma visão bem madura das coisas, e era só rap por fazer, por gosto e por amor em estar na rua e fazer freestyles. Mas eu senti uma felicidade muito grande, e o desejo de ser melhor, e de me superar. Senti que aquele era o meu habitat, e como disse viciei e a partir daí não parei mesmo mais, por nada. 

O nome Ex3mo Signo é conhecido por todo o país e o sucesso das suas rimas é inegável. Qual foi o melhor momento até agora?

Bem eu tive muitos bons momentos. Tive um leque de bons momentos, mas lembro-me de um que foi marcante e nunca me sai da mente. Sempre que tenho algum problema ou dificuldade no meu trabalho, eu lembro-me deste momento e ganho forças para continuar, que foi a venda da minha primeira mixtape “Força da Natureza Vol. 1”. Eu tinha dúvidas da minha popularidade… Na verdade eu já era muito popular, e já tinha inúmeras participações em álbuns e mixtapes de artistas, rappers e DJ’s, e era na altura o campeão dos featurings. Onde eu metesse a voz era um estrondo, então eu era apontado como um dos melhores MC’s em participações, e o pessoal aguardava a minha obra com muita expectativa. No entanto, ainda tinha aquele receio de chegar e não ter ninguém para comprar o meu trabalho. Mas quando cheguei ao Parque da Independência, para vender, havia uma fila enorme e tive excelentes vendas. Para um artista que não tinha apoio dos media na altura, que era mais underground, foi uma venda muito boa, porque tive muita adesão dos fãs. Senti-me tão bem, tão amado e acarinhado que foi um dos meus melhores momentos, a confirmação da minha popularidade e o reconhecimento do meu talento.

Mas todas as vendas que fizemos até agora foram satisfatórias, em especial a venda com o meu team, Elenco de Luxo. Aquilo foi uma super venda, pois até agora somos dos artistas que mais venderam em Angola em todos os tempos, independentemente do estilo. 

As dificuldades e a competitividade do meio artístico musical não passam ao lado de ninguém. Qual foi o momento mais difícil que ultrapassou, desde que iniciou a sua carreira?

Eu tive vários momentos difíceis, pois não tem como chegar ao mel sem passar pelas abelhas. Mas no entanto, eu lembro-me de algo que me desestruturou, que me abalou demais, que foi a perda de um amigo meu de infância, um dos melhores amigos que tive, a pessoa que me ensinou a cantar, e que me deu o meu primeiro emprego à parte da música. Ele era um amigo, um conselheiro, um irmão, aquela pessoa com quem eu partilhava tudo, que me meteu a fazer rap e me ensinou o que era a cultura hip hop. Aprendi imenso com ele e trabalhávamos juntos, eramos confidentes e morreu de repente, assim do nada. Senti como se não tivesse chão e não consegui escrever nada de bom e proveitoso, durante quase um ano. Daí eu ter ficado algum tempo sem lançar nenhuma obra, porque fiquei a recuperar-me disso, e a recuperar a minha auto-estima e a minha paz de espírito.

De todas letras que já compôs qual a que tem mais significado para si e porquê? Que mensagem pretende transmitir?

Das minhas letras, a que mais mexe comigo é a letra da música “Litito”, porque eu falo de mim, da minha trajectória, das dificuldades que tive até alcançar alguns dos meus objectivos. Quando comecei os meus objectivos eram atingir o sucesso, o topo, e ser reconhecido como rapper a nível nacional e internacional. Hoje tenho mais batalhas ainda, por uma questão de afirmação na diáspora.

A mensagem que eu transmito nessa música é de fé, de batalha, de luta, de superação e de motivação. A vida mostra-te vários caminhos bons e maus, e muitas das vezes mostra-te mais caminhos maus do que bons. Mas tu tens que ter capacidade de discernimento, tens de saber o que queres para ti, e o que é melhor para ti. Eu aconselho as pessoas a trabalharem, a correrem e a lutarem pelos seus sonhos, porque sonhar toda a gente sonha, realizar é que é um pouco mais complicado. Eu gosto de mensagens de motivação e é isso que eu transmito.

Disponibilizou para download, em Abril deste ano, a mixtape “Força da Natureza Vol. 2”. Porque decidiu distribuir gratuitamente o seu trabalho?

Resolvi distribuir gratuitamente este trabalho porque lancei a minha primeira obra em 2011, e era suposto eu lançar o Vol. 2 de seis meses a um ano depois, mas acabei por me juntar ao Ready Neutro e lançar o projecto “Efeito da Força”, o que consequentemente levou-nos a outro projecto, com o Elenco de Luxo, o “Isto Não é um Grupo”. Isso levou-me mais dois anos, e em vez de voltar a lançar a solo, volto a lançar com a minha produtora, a mixtape “Reunião Familiar”, em 2015. No entanto, eu senti que padronizei um pouco a minha imagem, que estava associada a grupos e colaborações. Vi que estava a perder a minha individualidade, e a capacidade de agradar os fãs a solo. Então, aproveitando o facto de que todos os artistas do Elenco resolveram que seria a altura de apostar nas nossas carreiras a solo, resolvi entrar de cabeça para esse projecto. Mas tinha que testar a minha popularidade, e de alguma forma desculpar-me aos fãs e agradá-los com alguma coisa, que não podia ser vendida. Foi mais um teste e um presente para os meus fãs, pois o país está a ultrapassar uma fase complicada, e a falta de divisas está a impossibilitar muitas pessoas de comprar. Então uni a minha necessidade de me afirmar à crise que se está a viver, e tudo isso motivou-me a lançar gratuitamente. Para além de que é uma forma de promoção para o álbum, juntamente com o EP que eu vou lançar agora. 

Fale-me um pouco do seu mais recente trabalho, “Opinião Pública”, que será lançado ainda este ano. Porquê só agora o lançamento do primeiro álbum a solo?

Eu vejo o meu álbum “Opinião Pública” como a jóia da minha coroa. É algo que eu venho a projectar já há alguns anos. É um desejo, é um sonho, é mais um filho para mim. Não deixa de ser mais uma demonstração de força, de capacidade e amor pelo rap e pela cultura, e uma forma de me expressar e repartir com o povo as minhas vivências e experiências. É uma crítica social, ao mesmo tempo é uma forma de partilhar as minhas alegrias com o meu público. Se eu tivesse que resumir o “Opinião Pública”, eu podia resumir com “vida”, porque eu vou transmitir vida, e as nossas vivências nesta obra, de uma forma muito angolana.

Eu estive envolvido em vários outros trabalhos musicais, e paralelos à musica também, e esses trabalhos foram como uma espécie de preparação deste álbum. Eu tenho este álbum como um pico, e quero atingir o ponto máximo da minha carreira. Aliás, acho que já atingi, mas como sou um pouco ambicioso quero mais. Preparei-me a carreira inteira para este álbum e será o primeiro de vários que irei lançar, mas essa é a jóia. Quero mostrar com este trabalho uma faceta mais completa e madura. O nome do álbum já acarreta uma responsabilidade, e eu não quero fazer feio… Acho que esta é altura certa para lançá-lo, e para mostrar o que fui colhendo, em relação às minhas experiências de vida, e espero que gostem. Neste álbum vão ver o Ex3mo na sua melhor versão, e podem contar com um dos melhores álbuns de rap de sempre!

O que pensa dos prémios confinados aos artistas da indústria musical?

Eu não faço o meu trabalhado focado nos prémios que posso vir a ganhar, mas sim por gosto. E o maior prémio que posso obter é o reconhecimento dos meus fãs. Não sei quais são os critérios para dar prémios, mas acho que quem trabalha merece algum tipo de reconhecimento, e se são sempre os mesmos a trabalhar então são sempre os mesmos a ganhar prémios.

Já foi premiado pelo seu trabalho? E ambiciona algum prémio em específico?

Sim ganhei em team, com o Elenco de Luxo, mas não deixam de ser também os meus prémios, um reconhecimento do trabalho árduo que tenho desempenhado pelo movimento hip hop, e pelo rap em si, durante os anos que me dedico à música. Ganhámos o prémio Melhor Rap do Ano, do Top Rádio Luanda, em 2014, e depois ganhámos o prémio Melhor Rap e Hip Hop, na gala de premiação do Angola Music Awards, com o tema “Fuba”, também em 2014.

Relativamente a ambicionar algum prémio em específico, eu não penso muito nos prémios de forma material. Como disse, o reconhecimento da minha música pelos meus fãs é o maior prémio que posso ter como artista.

E os fãs, como é a sua relação com eles?

A minha relação com os fãs é óptima, excelente, formidável!

Como vê o mundo da música em Angola? Há apoios para os nossos artistas?

O mundo da música em Angola é algo ainda em fase de crescimento: está bom e ainda a melhorar. Há artistas que já conseguem viver do seu trabalho, e há grandes produtoras. Não podemos esquecer que viemos de baixo e muitos já criaram impérios com a música, logo o quadro é positivo e tende a melhorar.

Quanto a apoios para artistas, é muito relativo, porque depende do teu tempo de trajectória e das aberturas que te vão surgindo na vida, e de investimentos que possivelmente possam fazer.

O que é que a música e a arte representam na sua vida? Para si o que é ser rapper? 

Para mim a música e a arte representam a vida. Uma forma de se posicionar e exprimir a minha posição na vida. A arte é isso, arte é vida.

Ser rapper para mim é ser um narrador de vivências, daquilo que as pessoas vivem e falam nas ruas. Enfim, é ser um repórter do pvo para o povo.  

O que há ainda por fazer na carreira do “Imperador”?

Eu ambiciono muito mais, e o ser humano é insaciável por natureza. De qualquer modo nunca estarei satisfeito com o que tiver, seja o que for, porque eu quero sempre mais.

Que conselhos deixa a um jovem que sonhe ser rapper?

O meu conselho é que não desistam dos seus sonhos. Se realmente descobrirem que têm esse dom, essa capacidade de o ser, façam-no bem. Investiguem, munam-se de cultura, de conhecimento, porque um bom rapper precisa disso. Acima de tudo, acreditem em si mesmos, e sejam verdadeiros no que escrevem, pois tudo o que escrevem acaba por directa ou indirectamente, influenciar a vida de alguém. Sejam o mais transparentes possível e não desistam.

Por fim, quais os seus planos para o futuro? Novos projectos? Concertos?

Bem, boa parte do meu futuro só a mim e a Deus pertence, mas em relação ao trabalho, tenho o meu EP “Desintoxicação”, já em fase de gravação, a mixtape “Efeito da Força Vol. 2” com Ready Neutro, também já na fase final de gravação, e tenho o álbum “Opinião Pública”, que na altura certa estará disponível à venda.

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