Em declarações à Lusa, o responsável afirmou que a decisão do Governo “era previsível” e está alinhada com a trajectória anunciada de retirada gradual das subvenções.
“Não é sustentável continuar com o preço altamente subsidiado. Estamos a subsidiar milhões e milhões, e esse combustível barato enriquece operadores económicos de países vizinhos como a Republica Democrática do Congo e até um pouco a Namíbia”, disse.
Segundo José Severino, o diferencial de preços cria redes perigosas de contrabando.
“O operador nunca compra ao preço bonificado nesse país, paga o preço real, mais caro que em Portugal, e compra aqui a um quinto do valor. Acabamos por criar redes que são perigosas, até para a própria soberania do país”.
O aumento do preço do gasóleo, de 300 para 400 kwanzas por litro , entrou em vigor Sexta-feira e representa a segunda subida do ano, no âmbito da política de retirada progressiva dos subsídios aos combustíveis.
O líder da AIA defendeu que os recursos gastos com a subsidiação dos combustíveis sejam canalizados para sectores sociais prioritários. “Precisamos de estradas, escolas, saneamento. Estamos num processo de recuperação de tempo perdido. Todo o dinheiro é pouco”, afirmou.
O Governo pretende alinhar os preços internos com os valores de mercado até ao final de 2025, libertando recursos públicos para setores como a saúde, educação e infraestrutura.
Desde 2023, a gasolina subiu de 160 para 300 kwanzas por litro, enquanto o gasóleo passou de 135 para 400 kwanzas, acumulando aumentos superiores a 120 por cento.
A eliminação dos subsídios representa uma poupança estimada de 400 mil milhões de kwanzas por ano, num esforço de consolidação orçamental apoiado por parceiros internacionais como o FMI e que segundo o executivo pretende libertar recursos.
Questionado sobre o impacto da medida no tecido empresarial, José Severino descartou efeitos relevantes na indústria, indicando que “90 por cento do parque industrial já tem energia eléctrica” e que a maior incidência recairá sobre empresas públicas como a Prodel (estatal de produção de electricidade), que ainda recorrem a gasóleo para gerar electricidade em algumas regiões.
“O impacto maior será na agricultura e nas pescas, mas mesmo aí o gasóleo continua a ser altamente subsidiado”, afirmou, referindo que há mecanismos para apoiar os produtores mais vulneráveis.
“Mexer nos combustíveis, em Angola, reflecte-se no custo dos bens”, admitiu, lembrando, no entanto, que no primeiro aumento do ano não houve impacto na inflação e acreditando que “também agora não vai haver” porque “a margem ainda é confortável para manter os preços actuais”.
O presidente da AIA alertou também para os custos de manter os subsídios, já que "subsidiar implica mecanismos de controlo fronteiriço, serviços de inspeção, segurança externa, exército, polícia. É uma distração de problemas fundamentais do país e uma despesa adicional”.
Quanto aos transportes públicos, Severino desvalorizou o risco de agravamento de preços: “O serviço de táxi, 90 por cento, é a gasolina, e a gasolina não foi mexida”.
O industrial reiterou que a política deve ser acompanhada por medidas de mitigação bem dirigidas, como a agricultura e as pescas, que "podem ser subsidiadas directamente para que não haja impacto no custo dos bens que produzem”.
Além disso, a racionalização da despesa com combustíveis deve estar inserida numa política mais ampla dirigida também para a melhoria das estradas.
“O Governo já aceitou a política de portagens. Vamos ter manutenção permanente das estradas e, logo aí, o PIB pode crescer 5 por cento. Parte da produção agrícola hoje não escoa por falta de vias”, apontou o dirigente associativo.
Para José Severino, a retirada gradual das subvenções é positiva e inevitável porque “é preciso canalizar essas verbas para a educação, para a saúde, para onde temos grandes défices. Já não há mais petróleo. O petróleo hoje é quase só para pagar dívidas”.