Em entrevista à Lusa na cidade alentejana de Sines (Portugal), onde esteve para actuar no Festival Músicas do Mundo, o músico de quase 83 anos partilhou que Angola gostava de ver, 50 anos depois da independência.
"Como nós começámos mal, temos que dizer que vamos recuar para melhor avançar. E melhor avançar não é contar com os mesmos que já nos fizeram mal. Têm que contar com outros que tenham têmpera", vincou.
"Estamo-nos a acobardar demais, (...) tem que haver aquele angolano de ontem, ousado, perspicaz, respeitoso, verdadeiro. Angolano, sem complexos. A gravata não é o mais importante. Os cursos tirados também não são importantes, senhor doutor, senhor engenheiro...", criticou.
O importante – questiona – é "saber o que é que ele faz, de que é que ele vive, como é que ele vive com a família dele, respeita quem, [se] saúda o povo na rua, [se] ajuda as pessoas".
À beira de completar 83 anos, José Adelino Barceló de Carvalho – mais conhecido como Bonga – vai ser condecorado no âmbito das celebrações dos 50 anos da independência de Angola pelo Presidente da República, João Lourenço, que iniciou esta Sexta-feira uma visita oficial de dois dias a Portugal.
A programação paralela do Festival Músicas do Mundo – que decorre em Sines até Sábado (com concertos que se estendem pela madrugada de Domingo) – inclui a exposição colectiva "Balumuka! – Narrativa poética da liberação... ou ainda, Rebelião Poética Kaluanda".
Bonga visitou a exposição antes de deixar Sines, para ver a capa do seu disco icónico "Angola 72" na parede do Centro de Artes.
À Lusa, elogiou "o contributo" dos artistas-activistas angolanos que integram a exposição, com curadoria de Kiluanji Kia Henda e André Cunha, com um olhar sobre a música enquanto veículo de preservação da história.
"Angola precisa de muitos mais" como Zezé Gamboa, António Ole ou Luaty Beirão. "Do jeito que está... [precisa de] muitos mais. Porque nós, da nossa geração, nunca ninguém pensou que ia ficar como está ficando", lamentou, lembrando que o país tem petróleo, diamante, ouro.
"Ai, espera aí, então, com tudo isso, não é para a gente ser feliz?", atira, perguntando onde está "a solidariedade" com "aqueles que comem em contentores e que estão na rua, desgraçados" e lembrando a "escola [que] não há, os hospitais [que] estão com problema".
O facto de viver fora há mais de 40 anos não lhe diminuiu o amor por Angola. "O país é o país. Agora, os homens é outra louça, (...) contra eles é que a gente se deve insurgir", sublinhou.
No caso dele, fá-lo "cantando, que é a melhor maneira" que encontra para dar "recados positivos para ajudar" o "grande povo" angolano.