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Opinião A Opinião de Janísio Salomão

Economia angolana em 2015. Um ano a reter!

Janísio Salomão

Mestre em Administração de Empresas, Consultor Empresarial e Técnico Oficial de Contas

As águas agitaram-se, até pareceria que o ano não chegaria no seu final. O prelúdio de 2015 foi marcado por: previsões, correções e incertezas. Fomos fortemente afectados por um iceberg, parecia até o filme “Titanic”. Será que não vimos o iceberg? Ou o vimos e julgamos ser pequeno que não causaria danos consideráveis à economia angolana?

Baía de Luanda:

Assim foi a crise, entrou de mansinho como quem não quer nada e acabou por criar enormes estragos e deixar sequelas, que indubitavelmente ficarão marcados dos anais da história e da economia angolana e certamente nos angolanos, foi duro e doloroso.

“A crise” uma das frases mais citadas durante o ano que agora finda, mostrou que a monodependência ou a famosa petrodependência, não é benéfico para qualquer economia, já diz o velho adágio que “o amanhã não sabemos”, assim funcionam os preços neste mercado, são voláteis.

A excessiva oferta do petróleo no mercado internacional e o abrandamento das principais economias mundiais, contribuíram para a redução do preço do barril de petróleo em mais de 50%, tal conforme a famosa “lei da procura e oferta”, vigentes nas economias de mercados abertos.

O Executivo Angolano foi obrigado a criar reuniões emergenciais e rever uma série de programas e projectos que se encontravam plasmados no Orçamento Inicial de 2015. As receitas petrolíferas constituem as principal fonte de receitas do OGE, contribuem em mais de 75% e consequentemente constituem a principal fonte das receitas fiscais, com um peso superior a 90%; Nesta senda, as receitas do OGE Inicial foram reduzidas em 35,7%, alterando o seu valor de 4,1 trilhões de kwanzas para 2,6 trilhões; Igualmente as despesas sofreram um corte de 33%, o seu valor passou de 5,2 trilhões de kwanzas para 3,4 trilhões.

Os investimentos que constituíam um dos principais combustíveis da economia angolana devido ao fluxo monetário movimentado e sendo uma das principal fontes geradora de emprego, sobretudo a camada mais jovem, acabou por sofrer um trágico corte de 53%, situação que acabou por desembocar numa significativa redução do seu valor inicial de 1,3 trilhões de kwanzas para 636 bilhões.

Como a economia é um ciclo, e as variáveis encontram –se intrinsecamente conectadas ou interligadas, as demais variáveis macroeconómicas, acabaram por ser afectadas o contribuindo destarte, para a desaceleração da economia angolana, após áureos anos de um significativo crescimento económico.

TAXA DE CRESCIMENTO DA ECONOMIA (PIB)

A taxa de crescimento foi fortemente afectada devido a excessiva dependência do a economia da principal commodity utilizada nas exportações com uma peso de 90% na Balança Comercial Angolana;

As perspectivas do Orçamento Geral do Estado  (OGE) inicial para o Exercício económico 2015, apontavam para uma taxa de crescimento 9,7%, fortemente impulsionado pelo sector petrolífero com uma previsão bruta anual de 669 milhões barris de petróleo a um preço inicial de 80 Usd;

Conforme anteriormente referenciado, a crise obrigou uma revisão do orçamento do Estado, fixando em 6,6% a taxa de crescimento da economia a um preço de comercialização do barril do petróleo a 40 Usd;

Foram igualmente revistas as perspectivas de crescimento do sector não petrolífero de 9,2 para 5,3%, o sector agrícola de 12,3% para 7,9%, indústria transformadora de 11,2% para 6,8%, construção 10,5% para 6% e serviços de 9% para 4%;

O relatório publicado pelo Banco Nacional de Angola (BNA), sobre o comportamento da Inflação no 1º trimestre de 2015, realça que “as últimas revisões efectuadas às projecções para 2015 dão conta de um crescimento real de 4,4% do PIB global, sendo que este acomoda um crescimento real de 7,8% do sector petrolífero e de 2,9% do sector não petrolífero”; As perspectivas apontadas pelo BNA, reduzem em 2,2 pontos percentuais as perspectivas iniciais de crescimento da economia Angolana.

Por sua  vez o Fundo Monetário Internacional (FMI), no seu relatório publicado no mês de Novembro, destaca que “o crescimento do PIB não petrolífero deve desacelerar para 2,1% em 2015. Os sectores industrial, da construção e dos serviços estão a ajustar - se à queda do consumo privado e do investimento público e às dificuldades persistentes para obter moeda estrangeira”. O referido relatório prevê um crescimento da economia de 3,5%, com o sector petrolífero a crescer 6,8%; Reduzindo 0,9 pontos percentuais as perspectivas de crescimento da Economia.

 

Conforme apontam os indicadores, existe uma tendência de redução do Crescimento da Economia Angolana, face a conjuntura macroeconómica do País, as metas inicias projectadas encontram –se aquém do cenário actual.

INFLAÇÃO

A inflação um dos principais males que geralmente  enfermam as economias  por se traduzir na subida generalizada dos preços dos bens e serviços transacionados na economia, durante um determinado período de tempo, acabou por contribuir fortemente para a desvalorização da moeda e do poder aquisitivo;

Ao longo dos tempos tornou-se um dos principais feitos alcançados pelo Executivo Angolano no período pós - independência por conhecer um abrandamento para taxas inferiores a 2 dígitos;

Conheceu durante o ano de 2015 sucessivos aumentos desde Julho de 2015, o OGE inicial, apresentava uma taxa de inflação de 7%, perspectivas que acabaram por ficar aquém do real, a taxa de inflação acabou por se situar na casa dos 2 dígitos, cifrando-se em 13,29%.

A taxa de inflação em Angola registou níveis altos nos primeiros 5 anos depois em que registou a paz e a crise económica e financeira internacional; Os níveis mais baixos ocorreram no anos de 2012 e 2013 em que as taxas atingiram um dígito, cifrando –se em 7,69% e 7,48% respectivamente.

TAXA DE JURO 

A taxa de juro constitui um principal mecanismo de combate as tendências inflacionária; Normalmente os Bancos Centrais (BC) aumentam a taxa básica de juro como uma medida de controlo da massa monetária em circulação. Através desta medida, os BC’s podem absorver dinheiro da economia, colocando no mercado Bilhetes do Tesouro (BT) ou Títulos dos Bancos (TBC) Centrais, ou seja, o aumento da taxa básica de juro atraí o investimento em títulos públicos que acabam por diminuir a massa monetária (dinheiro em circulação) na economia, impactando na redução da variável consumo.

E o oposto, redução da taxa de juro, reduz os investimentos em títulos do Banco Central, aumentando o crédito à população, que acaba por aumentar a massa monetária em circulação e consequentemente o consumo.

Como tal, o mercado reage de acordo a lei da oferta e procura, quando a oferta diminui, acaba por aumentar os preços dos bens e serviços e quando aumenta acontece o inverso, os preços diminuem.

Tal como a inflação a taxa de juro base conheceu sucessivas alterações durante o ano. A primeira ocorreu durante o 1º trimestre de 2015 em que a taxa sofreu uma aumento de 9% para 9,25%, no 3º trimestre de 10,25% para 10,50% e no 4º trimestre de 10,50%  para 11%, uma variação de 2 pontos percentuais  de Fevereiro a Dezembro.


TAXA DE DESEMPREGO

A crise económico, financeira e cambial tem sido a principal impulsionadora do desemprego em Angola. Embora a história do desemprego no pais esteja associado a diversos factores, com relevo para os históricos, tais como: o processo de colonização e conflito armado; A crise contribuiu significativamente para o aumento da taxa de encerramento ou morte das empresas, com destaque para o sector da Construção civil que emprega grande parte da mão –de obra directa; Desde o princípio de ano que persiste a dificuldade de obter a moeda estrangeira e envio de remessas para o exterior. Durante o ano as empresas viram os seus pagamentos sem efectivação, a situação ficou complicada, as empresas viram grande parte dos seus pagamentos pendurados sem no entanto se poder vislumbrar um horizonte para os seus pagamentos por parte do Estado Angolano.

De acordo Manuel Viage, Secretário-Geral da Confederação Sindical Angolana, em declarações a Imprensa  “a construção é o sector que mais sente a falta dos recursos financeiros do Estado devido à quebra para metade das receitas fiscais com a exportação de petróleo. Neste sector perderam-se mais de 6.500 empregos este ano, dos quais 2.000 sindicalizados. Realçou ainda que as dificuldades do Estado nos pagamentos estão na origem de um corte da força laboral na construção civil em Angola que poderá ser de 10%. Depois da construção civil, o sector do comércio e serviços e a indústria são os sectores mais afectados pela crise”.

Embora não seja possível precisar com exatidão a taxa de desemprego em Angola, devido a ausência de estudos profundos sobre a matéria, podemos dizer que a mesma encontra –se cifrada na casa dos dois dígitos 26%, estimando –se que este ano a mesma atinja uma taxa de 36%.

 

TAXA DE CÂMBIO

A moeda angolana sofreu acentuada desvalorização ao longo do ano de 2015 em cerca de 30% face ao dólar, quando comparado com o mercado informal o seu valor tende a aumentar significativamente.

A escassez de divisas para atender a demanda contribuiu significativamente para a sua desvalorização.

Tal conforme realçou o BNA, “No que toca aos diferenciais da taxa de câmbio do Kwanza face ao dólar norte-americano, entre o mercado informal e o mercado secundário de notas, observou-se um aumento dos diferenciais em todas as províncias, destacando-se as províncias de Benguela, Luanda, Huambo, em que o diferencial subiu 38,76 p.p. (para os 44,76%), 25,99 p.p. (para os 41,28%) e 36,84 p.p. (para os 43,04%), respectivamente, em termos homólogos.

Esta depreciação cambial surge num momento em que a entrada de divisas na economia tem sido inferior desde o II semestre de 2014 até à actualidade, no seguimento da diminuição do preço do crude nos mercados internacionais e, consequentemente, das receitas petrolíferas. Este é um dos factores que poderá ter contribuído para a aceleração da inflação desde então”.

Durante o período de Janeiro a Novembro, registou –se um aumento de 30% do valor médio da taxa de câmbio o seu valor passou de 104,46 Kz para 135 Kz por dólar.

RESERVAS INTERNACIONAIS LÍQUIDAS

De acordo Fulgencio, “as reservas Internacionais Líquidas (RIL) refletem o montante de moeda estrangeira e metais preciosos acumulados por um país. É o total da moeda estrangeira (principalmente dólares) mantido pelo Banco Central (BC) disponível para uso imediato. A sua maioria tem origem nos superavits do balança de pagamentos ou seja o remanescente favorável da entrada e saída de valores (importação vs exportação), quanto maior for a entrada de divisas em relação a saída, o país acumula reservas”.

As reservas internacionais líquidas de Angola conheceram um crescimento ao longo dos anos devido a alta dos preços do principal produto utilizado na sua balança comercial, o petróleo.

Com a redução do preço desta principal commodity, as reservas internacionais líquidas do pais encontram –se em queda livre, ou seja, o seu valor reduziu consideravelmente.

 

As RIL conheceram uma crescimento de 26% de 2009 a 2012 passando o seu valor de 13 mil milhões para 30,8 mil milhões de dólares;

De 2012 a 2015 as RIL conheceram uma redução de 62%, o seu valor passou para 19,2 mil milhões de dólares, devido a queda abrupta do preço do barril de petróleo no mercado Internacional.

STOCK DA DÍVIDA PÚBLICA

Fruto da conjuntura actual do país e de forma a garantir a prossecução dos serviços públicos o governo Angolano tem recorrido ao endividamento interno e externo, como uma forma para suprir as despesas correntes e de capital.

A dívida pública teve um crescimento de 35% , o seu valor passou de 34,84 mil milhões de dólares para 47 mil milhões de dólares. A crise económico e financeira que o país está atravessar, contribui significativamente para o aumento da dívida pública com grande destaque ao mercado externo.

A preocupação é o aumento significativo da dívida em relação ao Produto Interno Bruto nos últimos anos. O seu valor tem estado aumentar consideravelmente o que pode criar repercussões futuras, pois o nível de endividamento poderá ser superior caso não, se tomem mediadas cautelares comparativamente a capacidade do pais gerar riqueza.

Embora o seu peso em relação ao PIB tenha reduzido comparativamente ao ano de 2009, podemos observar que desde 2013 que a mesma apresenta uma perspectiva ascendente; O seu valor corresponde segundo as previsões do MINFIN para este ano o equivalente a 45,8% do PIB, embora o FMI no seu último relatório aponte que, a dívida de Angola no final do ano venha a corresponder a 57% do PIB.

O que podemos depreender é que a escassez de receitas tem obrigado o Estado Angolano a criar fontes alternativas para a prossecução dos seus programas e projectos, e sem alternativas imediatas grande parte dos recursos para financiar as despesas pública têm sido recorrentemente as fontes internas e externas.

Concludentemente, podemos afirmar que este ano foi marcado por desafio ingentes é importante realçar que com as dificuldades que o pais atravessou grande parte dos serviços públicos foram garantidos embora com dificuldades, como é o caso, dos sectores da educação, saúde e segurança pública, garantindo desta forma o consumo dos principais bens e serviços, que são relevantes em períodos de abrandamentos das economias;

O ano que agora finda, obrigou o executivo a tomar medidas drásticas de contenção de despesas, obrigando assim grande parte dos gestores públicos uma gestão mais parcimoniosa e prudente dos recursos a sua disposição, pelo que sempre defendemos que a boa gestão não deve apenas ser feita em tempos de crise, os recursos devem ser bem geridos e alocados também em tempos de fartura e abonança.

2015 deixa assim um marco na história da economia Angola, com destaque para o encerramento de empresas, aumento das taxas de desemprego, abrandamento da economia, deficit das contas públicas, aumento da inflação, redução do poder de compra e desvalorização dos salários reais. Situação que contribuiu para um aumento significativo da dívida pública e redução significativa das reservas liquidas internacionais.

2016 já bate à porta, pelo que nos mostra os principais indicadores que constam no OGE  e cujas algumas metas já foram ultrapassadas como é o caso da inflação, teremos seguramente um ano árduo pela frente.

Opinião de
Janísio Salomão

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