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Opinião A opinião de...

A economia abrangente “tecnicamente escondida na agricultura”

Jesus Quiuma

Estudante e investigador

Caracterização da economia antes da independência. Angola nasceu como pátria livre e independente a 11 de novembro de 1975, depois de longos e duros anos de guerra fratricida que opôs dois dos três movimentos que lutaram contra o jugo colonial.

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A independência nacional constituiu a realização de um sonho que caracterizou a luta de gerações que, ao longo da dominação colonial, conviveu diariamente com as humilhações perpetradas pelos dominadores.
Apesar da forte participação da indústria extrativa – baseada particularmente no ferro, diamante e petróleo – que teve um crescimento exponencial entre 1960 e 1972 - até a independência, a economia angolana era dominada pelo sector agrícola.

Sobre a dominação da agricultura na economia angolana, Fituni (1985), destaca que, em 1973 existiam em Angola 8.038 empresas agrícolas. De 1965 até a independência, o sector agrícola ficou marcado pela sua característica exportadora. Ainda de acordo com o autor, apesar da forte produção agrícola - contando com a forte utilização do maquinário agrícola e com um número de assalariados estimado em 250.000 – pouco menos de 2% da produção total era consumida no país, servindo essencialmente de base para a alimentação dos operários assalariados.

Nas últimas 2 décadas que antecederam a independências, os investimentos no setor agrícola estavam predominantemente ligados à produção de café, algodão, cana de açúcar, sisal e bananas. Este investimento teve como
resultado, a transformação de Angola em um dos principais produtores mundiais de café – com quase 2/3 da colheita mundial - ao lado do Brasil, Colômbia e da Costa do Marfim (FITUNI, 1985).

Na primeira metade da década de 70, Angola produziu em média 218 Mil toneladas de café por ano, representando 5% do total da colheita mundial. Como aponta Futini (1985), Angola assegurava cerca de 19% da procura mundial de café.

Com a alta nas exportações do café, Angola recebia mais de 1,7 mil milhões de escudos anualmente, constituindo assim o principal produto agrícola gerador de receitas. O algodão era - quanto a sua importância - a segunda cultura de exportação produzida no sector empresarial agrícola. Em 1973 representava 11,6% do valor da produção bruta da agricultura.

Outro produto que merece destaque é o sisal: Angola figurava no 3º lugar quanto à produção desta cultura, ficando apenas atrás do Brasil e da Tanzânia. Essa posição garantia aproximadamente 10% da colheita mundial e 25% da colheita Africana.

A ascensão do petróleo como principal fonte de receita e a precarização do sector agrícola

Já a partir da segunda metade da década de 70, as políticas econômicas levaram-nos a reformular a base de sustentação da nossa economia, definindo o petróleo como principal fonte de receita do país (representando pouco mais de 60% do total de receitas).

Essa reformulação ficou evidente após o conflito armado, tendo o petróleo desempenhando importante papel no crescimento que Angola viveu com boom registrado entre 2004 e 2009. As exportações de Angola concentraram-se essencialmente no petróleo, o que tornou a nossa economia dependente do petrodólar. A dependência sobre a qual debatemos, se reflete nas movimentações da nossa Balança Comercial, que acompanham de forma
paralela a alta ou não do preço desta Commodities.

Por exemplo, de 2012 a 2017, com a drástica queda do preço do petróleo, Angola registrou uma queda de US$ 28,1 mil milhões nas suas exportações, ou seja, passou de US$ 58,4 mil milhões para US$ 30,3 mil milhões do total de exportações (TRADE ECONOMICS, 2019).

Como aponta uma pesquisa do Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola, sendo um dos países no mundo que mais cresceu entre 2000 e 2011, Angola é o 2º maior exportador de petróleo da África subsaariana e o 5º maior produtor mundial de diamantes (CEIC, 2013).

Este crescimento não se reflete nas condições sociais da população, que é penalizada pela excessiva concentração de renda. Uma das consequências que também advém da concentração de receitas no setor petrolífero tem que ver com o crescimento acentuado da informalidade. Ela tem sido alternativa para a busca de renda por parte da população.

Entretanto, ficou provado que ter uma economia dependente do petrodólar, condiciona a continuidade do crescimento e, consequentemente, o desenvolvimento do país. Portanto, faz-se necessário nos desvencilhar da economia excessivamente petrolífera e darmos espaço para outros sectores (com destaque ao da agricultura).

Considerada a base de sustento para qualquer sociedade, o setor agrícola representa importante saída para a tão propagada campanha de diversificação da economia. Além de equilibrarmos os produtos exportados, potencializar a agricultura como um todo trará benefícios à agricultura familiar que nos ajudará a reduzir os índices de pobreza no país.

Para tal, os nossos investimentos precisam ser redirecionados no sentido de se ver diversificada a nossa economia. Ao invés de investirmos de forma desenfreada na aquisição de ativo no estrangeiro, por exemplo, em parte, os investimentos deveriam ser direcionados ao sector agrícola.

Com o número grandioso de recursos naturais, solo e clima relativamente favoráveis, o nosso país dispõe de alternativas para guindar na esfera das nações desenvolvidas. O investimento precisa estar alinhado com a verificação dos atuais métodos de organização da produção, com a real intenção de impactar no ritmo de desenvolvimento do sector.

Para voltarmos a ter um sector agrícola forte e com significativa participação na economia, as políticas para alavancar este sector precisam não perder de vista, entre outras coisas, o investimento na mão-de-obra, no maquinário, transportes e sistemas de irrigação que diminuam a dependência da produção dos fatores climáticos (especificamente a chuva).

Apesar dos entraves que existem em Angola - que passam pela quase ausência de investimentos, destinação de terras aráveis para outras finalidades, campos agrícolas minados, etc. et al. - o sector agrícola representa
uma das potencialidades que temos para alavancar a economia angolana, obrigando-nos a estabelecer novos fundamentos da sua participação na economia, proporcionando competitividade e crescimento sustentável.

Referências

Centro de Estudos e Investigação Científica da Universidade Católica de Angola – ceic-ucan.org “Relatório social de Angola 2012” FITUNI, L. L. Angola-Natureza, População e Economia. Moscou: Editora Progresso, 1985.
TRADE ECONOMICS, 2019

“Sonho em ver a produção agrícola como uma das principais responsáveis pelos valores da balança comercial de Angola”.

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Jesus Quiuma

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