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Defesa

Jovens querem fim da “cultura do medo” e pedem polícia amiga dos cidadãos

Dezenas de jovens juntaram-se na manhã de Sábado em Luanda para apelar ao fim da violência policial na sequência das várias mortes associadas à actuação da polícia desde o início da pandemia de covid-19.

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Um grupo mobilizado pelo 'rapper' Brigadeiro 10 Pacotes sob o lema "Todos pelos Direitos Humanos. Não Toca no Meu Irmão" juntou-se cerca das 10h00 na Igreja da Sagrada Família pedindo a demissão do ministro do Interior, Eugénio Laborinho, e reformas na polícia, para que os cidadãos "em vez de terem medo, vejam a polícia como protector".

Gritando palavras de ordem e distribuindo panfletos denunciando "actos bárbaros" contra o activista Jorge Kisseque, alegadamente alvejado pela polícia, e o médico Sílvio Dala, morto no início de Setembro, o protesto, um dos quatro que aconteceram em Luanda, juntou mais forças policiais do que manifestantes, com elementos da polícia antimotim, cavalaria e brigada canina atentos aos jovens.

Em declarações à Lusa, Brigadeiro Dez Pacotes, cujo nome verdadeiro é Bruno Santos apelou à demissão do ministro da tutela e pediu escolas para formação da polícia, a fim de melhorar a cultura jurídica e pedagógica quando abordam os cidadãos.

"A polícia é um órgão que deve garantir a confiança do cidadão, hoje vivemos numa insegurança grave em que todos os cidadãos ao depararem-se com a polícia têm medo, em vez de encararem a polícia como um protector", afirmou o activista, pedindo "reformas" para que "a polícia seja amiga do cidadão".

"A polícia não pode ser instrumentalizada para a manutenção do poder do MPLA e reprimir o povo" e "semear o medo", criticou o 'rapper', que anunciou no início do ano a intenção de lançar um novo partido político.

Brigadeiro 10 Pacotes sublinhou que Angola ratificou a Declaração Universal dos Direitos Humanos e que se está perante "um atentado" a esse tratado.

"Não vamos admitir um Estado que mata os seus cidadãos, que viola sistematicamente os Direitos Humanos, um Estado que ameaça, um Estado que aterroriza ao invés de proteger", desafiou.

"As vidas angolanas importam", lia-se num cartaz empunhado por um manifestante num outro protesto ("Não à brutalidade policial") que começou pelas 12h00 junto do Clube 1.º de Agosto, numa alusão ao movimento activista internacional que teve origem na comunidade afro-americana.

Cerca de 50 jovens, muitos vestidos de negro, concentraram-se neste local, exibindo cartazes caseiros onde pediam "Parem de nos matar" e "Basta de mortes! São pagos para proteger não são pagos para matar", enquanto outro exigia "Laborinho [ministro do Interior] fora".

"Esta concentração é uma resposta que nós, jovens independentes, entendemos fazer como forma de dizer basta a violência", afirmou à Lusa um dos organizadores deste protesto, Israel Campos, recordando que os últimos dias têm sido marcados por "episódios lamentáveis" que chocam a sociedade e "infelizmente" envolvem uma instituição que devia garantir a segurança dos cidadãos.

"Por isso nos reunimos para dizer 'chega de violência policial'", reiterou, acrescentando que deve haver responsabilização e que os pedidos de desculpa da polícia "não chegam" porque "não se pode continuar a permitir que angolanos inocentes morram desta maneira".

"Ter uma arma na mão é uma responsabilidade muito grande e temos de nos certificar que só são usadas em situações extremas e não para resolver situações mínimas", destacou o jovem, salientando que "não é contra a polícia", mas os angolanos "estão fartos".

David Mendes, um dos manifestantes, quis estar presente porque "as vidas angolanas importam" e acusou a polícia de agir de má-fé e não proteger os cidadãos: "Nós já não temos medo da pandemia, temos medo da polícia, que mata mais do que a doença, não temos amigos ou familiares mortos de covid-19, mas temos amigos, familiares e vizinhos que morreram pela brutalidade da polícia", afirmou, mostrando-se indignado com as mortes.

O activista considerou também que o ministro do Interior e o Comandante Provincial de Luanda se devem demitir pois não mostraram ter competência necessária para gerir o problema da polícia "que está a aterrorizar as pessoas".

"Queremos que rolem cabeças", disse Davide Mendes, assinalando que os problemas não são de hoje e que a polícia comete "barbaridades" por que "não tem pedagogia".

A marcha "Não à Brutalidade Policial" seguiu até ao Largo das Heroínas, onde terminou com a leitura de um discurso sobre os direitos humanos.

Em Luanda decorreram quatro manifestações: uma de carácter político, de apoiantes do PRA-JA Servir Angola, projecto partidário de Abel Chivukuvuku, que estão contra a actuação do Tribunal Constitucional. As outras três contra a violência policial, incluindo uma convocada pelo Sindicato Nacional dos Médicos de Angola (Sinmea) depois da morte do pediatra Sílvio Dala.

Desde o início da pandemia, mais de uma dezena de pessoas perderam a vida na sequência de intervenções policiais para obrigar ao cumprimento dos decretos presidenciais com as medidas que vigoraram no estado de emergência e agora na situação de calamidade pública, nomeadamente o uso de máscara facial.

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