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Defesa

Ex-chefe dos serviços secretos militares nega ter rejeitado acatar ordens do Presidente

O ex-director dos Serviços de Inteligência e Segurança Militar, António José Maria, negou esta Quinta-feira em tribunal ter rejeitado cumprir a orientação do Presidente para devolver documentos com informações secretas militares ao Estado.

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O general começou a ser julgado na Quarta-feira pelo Supremo Tribunal Militar, pelos crimes de insubordinação e extravio de documentos, aparelhos ou objetos que contêm informações de caráter militar, e esta Quarta-feira a sessão foi marcada pelo seu interrogatório e de três declarantes.

António José Maria, de 73 anos, respondeu a todo o interrogatório, de mais de cinco horas, apenas com um intervalo de 15 minutos, em pé, mesmo depois de várias vezes convidado a sentar-se pelo juiz do processo, o general António dos Santos Neto "Patónio".

Nas respostas ao interrogatório, António José Maria, general na reforma, que responde ao julgamento em prisão domiciliária desde Junho deste ano, fez recurso variadíssimas vezes a expressões em latim e preciosismos gramaticais, perdendo-se em detalhes das suas experiências profissionais, sendo o tribunal obrigado a situá-lo para o essencial.

No início do interrogatório, o arguido, que é acusado do crime de insubordinação, disse que não se negou a fazer a devolução dos documentos referentes à célebre Batalha do Cuito Cuanavale, ocorrida em 1988, na província do Cuando Cubango, entre os exércitos angolano e sul-africano, mas terá sugerido que, antes de assim proceder, o Presidente João Lourenço contactasse o seu antecessor, José Eduardo dos Santos.

A acusação refere que o chefe de Estado deu orientações ao chefe dos Serviços de Inteligência e Segurança do Estado (SINSE), Fernando Miala, para contactar o arguido e dar-lhe o prazo de 48 horas para devolver ao Estado os documentos que guardou nas suas residências e na sede da Fundação Eduardo dos Santos (FESA) cujo patrono é o ex-Presidente, José Eduardo dos Santos.

"Tendo o material na FESA, seria de bom tom que o Presidente João Lourenço contactasse o camarada José Eduardo dos Santos para se tratar desta questão da devolução do material da Batalha do Cuito Cuanavale, uma vez que o [ex-] Presidente José Eduardo dos Santos é o dono da sua casa, dono da FESA", disse.

O arguido confirmou que foi ele quem tirou os documentos das instalações do SISM durante a sua saída, esclarecendo ainda que o dinheiro usado para a aquisição desse material aos sul-africanos, que custou ao Estado, segundo a acusação, 4,2 milhões de dólares, foi dado pelo ex-Presidente José Eduardo dos Santos e não saiu do orçamento do SISM.

Questionado pelo juiz de quem era a propriedade dos documentos, o general respondeu que pertenciam ao Estado, mas "o Estado tem nome: José Eduardo dos Santos".

"Os documentos não eram meus, adquiri-os para atingir um objectivo, são propriedade do Estado, levava-os ao Presidente José Eduardo dos Santos", referiu.

António José Maria adiantou que dos vários auxiliares do então Presidente José Eduardo dos Santos, chamados a orientar o registo da história militar de Angola, com destaque para a Batalha do Cuito Cuanavale, para as gerações vindouras, apenas ele se empenhou, tendo chegado a compilar cinco volumes, que não foram ainda publicados devido às eleições gerais em 2017.

Sobre o encontro com Fernando Miala, o arguido admitiu que nunca deveria ter aceitado tal reunião, que se realizou num restaurante, mais concretamente dentro da sua viatura, porque o mesmo não era portador de nenhum documento formal como mandatário de João Lourenço.

"Com que autoridade o senhor Miala me foi contactar? E mesmo assim não deixei de falar com ele, apesar de tudo", declarou, acrescentando que desde aquele encontro até à presente data não voltou a ver ou falar com o chefe do SINSE.

Para o arguido, é necessário que se faça recurso com "extrema urgência" a um suporte tecnológico do encontro que teve com o chefe do SINSE. "Não acredito que o senhor Miala não se tenha socorrido de um suporte tecnológico", referiu.

À instância do Ministério Público, António José Maria reconheceu que os documentos são das Forças Armadas Angolanas e que não teve autorização de "ninguém" para os retirar do SISM.

A terceira sessão de julgamento continua esta Sexta-feira, com a audição dos restantes declarantes e testemunhas arroladas pelas partes.

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