Como não conduzo (o que não deixa de ser desgastante na mesma), cedo encontrei uma maneira de minimizar esse desgaste das horas que se passam dentro de um carro. E o que faço é observar o que acontece do outro lado do vidro. Aprendi a conhecer o dia-a-dia das pessoas que circulam nos passeios ou na berma das estradas e alguns dos seus hábitos, sentada no lado do "pendura".
São muitas as pessoas que circulam a pé. Por muitos e variados motivos o fazem, sendo precisamente um desses motivos o de chegarem mais depressa ao seu destino.
Observando eu os hábitos de quem circula, percebi rapidamente que em cidades como Luanda (ou outras cidades do país de grande concentração populacional), as pessoas não só se deslocam a pé de um lugar para o outro, como também fazem das ruas os seus locais de trabalho. No meio dos carros, parados ou a avançar muito lentamente, vende-se de tudo um pouco. Água e refrigerantes (mantidas frescas em grandes sacos de plástico com gelo), fruta, pipocas, jinguba ou castanha de caju, lâmpadas, acessórios electrónicos, cabides, espelhos e armários de casa de banho, extintores de vários tamanhos, óculos de sol para todos os gostos, baldes para o lixo, relógios de parede para a cozinha, triângulos de sinalização e cordas de reboque, enfim, uma parafernália de objectos ali mesmo à mão de semear, sem ter que sair do carro.
E foi assim que me surgiu esta pequena curiosidade... Porque é que os miúdos que vendem na rua e as zungueiras usam os chinelos mais pequenos que os seus pés?
Pergunto, de vez em quando, a pessoas que penso terem algum conhecimento dos hábitos e costumes locais, mas nunca me sabem dizer qual o motivo. Certa vez, explicaram-me que é propositado, para quando têm que fugir aos fiscais, uma vez que a venda ambulante não é permitida por lei, os ditos fiscais não consigam pisar a parte de trás do chinelo para os apanhar, enquanto correm. Uma explicação um tanto ou quanto inusitada, mas talvez até faça sentido...! Continuando a minha tentativa de satisfazer este “mistério”, mais tarde, em conversa com um artesão, que também tinha os chinelos mais pequenos que os pés, contei-lhe a história da fuga aos fiscais. Ele riu-se muito, durante o tempo suficiente para que eu me começasse a sentir ligeiramente constrangida, a achar que estava a ser inconveniente, e respondeu-me (sem deixar de rir) "nãaao dona, é mesmo só moda!"
Ao que parece, uma moda que ficou para durar. Assim como a minha curiosidade.