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Opinião Lições de uma crise

O oportunismo que agrava a crise

Quingila Hebo

Quingila Hebo é estudante de economia e jornalista na Revista Economia e Mercado.

Se continuarmos como estamos, os bancos comerciais que actuam no sistema financeiro angolano irão agravar ainda mais os efeitos nefastos que a crise (entenda-se redução de receitas petrolíferas) pode nos provocar. As medidas adoptadas pelo Banco Nacional de Angola (BNA) são legítimas, enquadrando-se na estratégia de redução do peso do dólar na economia nacional e conferir mais autoridade ao nosso kwanza. Mas, o que se nota é que os bancos estão a aproveitar-se desta situação para açambarcarem o sistema financeiro visando o lucro fácil. Os bancos compram valores em dólar nos leilões que o BNA realiza para atender as necessidades, mas estes não repassam pela via legal ao mercado secundário, ou seja, a nós que precisamos destes dólares.

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Nota-se que, como uma forma de tirarem maiores dividendos, injectam esses dólares no mercado informal. Dito desta forma até parece uma acusação, mas, ora vejamos, custa-me acreditar, por exemplo, um individuo não ter acesso ao dólar no banco, que teoricamente é o lugar do dinheiro, sendo que os agentes do mercado informal, vulgo “Kinguilas” têm sempre dólares para vender. Se as “Kinguilas” não participam nos leilões do BNA, onde é que elas encontram 5, 10, 20 mil dólares para vender?!

Para mim, a resposta está naqueles casos em que os bancos pedem comprovativo de viagem (passaporte com o visto e bilhete de passagem) aos clientes quando vão solicitar moeda estrangeira, tiram cópias, anexam e no final dizem ao cliente que não há disponibilidade monetária, mas nos seus relatórios de contas aparece como quantia vendida, entre outras irregularidades, e é dessa forma que encontram mecanismos para repassar os dólares ao mercado informal.

Tudo isso faz-me crer que há aqui um jogo de oportunismo que agravará ainda mais os efeitos finais da crise, porque essa falha do sistema financeiro tem uma implicação directa na subida galopante da taxa de câmbio e consequentemente a de inflação, que temos vindo a travar com ela uma luta renhida para mantê-la abaixo de um dígito, e torna a vida no país sempre mais cara. Além disso, estas irregularidades também revelam-se contra as intenções de o BNA estabilizar o mercado financeiro nacional, bem como destapa fragilidades dos instrumentos legais de controlo e combate ao branqueamento de capitais.

É chegada mais do que a hora de o BNA sancionar, através do impedimento de participar nos leilões, os bancos que incorrem nessas práticas. O BNA deve aplicar multas, suspender as actividades por algum tempo se necessário, como uma medida de disciplinar os agentes do nosso sistema financeiro, porque, além do interesse de obterem lucros, há, acima de tudo, o interesse de desenvolvimento nacional, de termos uma economia pujante capaz de competir ao nível de África e quiçá mundial.

Opinião de
Quingila Hebo

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