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General “Facho” homenageado depois de uma vida de “vicissitudes” na guerra e na paz

Já é com dificuldade que Francisco Deolindo da Rosa consegue andar, devido a uma trombose, mas a lucidez está bem viva para recordar as "muitas vicissitudes" de uma vida que, entre 1961 e 2002, foi vivida em permanente guerra.

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Francisco Deolindo da Rosa, 71 anos, combateu 41 nos dois conflitos em Angola (colonial e civil), ficou conhecido nas fileiras das extintas Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA) por general "Facho", "nome de guerra", e foi um dos homenageados no Sábado com a Medalha de Mérito Militar de 1.ª Classe pela liderança militar naquela que foi uma das mais duras batalhas que o país viu: a do Cuíto Cuanavale.

Sentado numa cadeira ao sol, onde recebeu a medalha das mãos do Presidente João Lourenço, no Dia da Libertação da África Austral, o general "Facho" salientou à agência Lusa o "orgulho" que sente por ter pertencido a uma geração que tudo deu pela independência e pela paz em Angola e que agora vê, na distinção, "mais um reconhecimento", desta vez ao mais alto nível, que juntará aos "muitos outros" já recebidos.

"Isto, para mim, é histórico. Para mim, representa uma coisa histórica, porque de facto as coisas são assim. Isto representa as vicissitudes da minha vida", sublinhou, aludindo ao facto de a homenagem, bem como outra a cerca de meia centena de antigos militares, vir de toda a África Austral.

O antigo militar mostrou-se "surpreendido" por todos os homenageados pertencerem às extintas FAPLA (actuais Forças Armadas Angolanas - FAA), que foram agraciados não só em nome de Angola, mas por todos os 16 Estados membros da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), uma vez que o "23 de Março (de 1988)" foi considerado feriado regional nos países do Sul do continente africano.

Segundo os argumentos do Governo, que esteve na base da aprovação da efeméride na SADC, o fim da batalha do Cuíto Cuanavale (23 de Março de 1988) abriu portas à paz em Angola, à independência da Namíbia e ao fim do regime de segregação racional e à libertação de Nelson Mandela na África do Sul.

Além de João Lourenço, estiveram presentes no ato central da primeira celebração da efeméride os presidentes da Namíbia, Hage Geingob, da República do Congo, Dennis Sassou Nguesso, da República Democrática do Congo (RDC), Félix Tshisekedi, e do Zimbabué, Emmerson Mnangagwa, além de outras altas individualidades dos restantes 12 Estados membros da SADC.

"Passei muitas vicissitudes durante a guerra", disse o general "Facho", destacando que as mais difíceis foram as passadas nas batalhas do Cuíto Cuanavale e do Kifangondo.

A primeira, do Cuíto Cuanavale, lutou-a contra as Forças Armadas da Libertação de Angola (FALA, ligadas à União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA, de Jonas Savimbi) -, entre 15 de Novembro de 1987 e 3 de Março de 1988, e a segunda, a do Kifangondo, iniciada a 10 de Novembro de 1975 (na véspera da proclamação da independência) em Cacuaco, a 30 quilómetros de Luanda, contra o Exército de Libertação Nacional de Angola (ELNA), ligada à Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA, de Holden Roberto).

Sobre os dois confrontos, o antigo militar das FAPLA escusou-se a tecer quaisquer comentários de cariz político, optando por lembrar apenas que eram "necessários" para garantir o futuro de Angola, admitindo, porém, a importância da batalha de Kifangondo, que precipitou a proclamação da independência, e a do Cuíto Cuanavale no processo negocial para a paz, que culminou com os acordos de Nova Iorque (22 de Dezembro de 1988).

Depois da paz, alcançada em 2002 na sequência da morte, em combate, de Jonas Savimbi, e já com o ELNA "praticamente fora de combate", Francisco Deolindo da Rosa admitiu ter sido difícil "adaptar-se à vida civil", mas acabou por assumir que esse era o objectivo de uma vida para começar a desenvolver um país devastado por 41 anos de guerra.

No entanto, só em 2009 viria a ter protagonismo, ao tornar-se governador do Bengo - o general "Facho" nasceu a 8 de Abril de 1947 em Nambuangongo, município dessa província - na sequência da morte de Manuel Lopes Maria "Ximutu", a quem sucedeu.

"Em 1961, tinha 16 anos. Desde aí vivi sempre em tempo de guerra. Foi sempre assim a minha a vida. Muito orgulhoso com esta medalha. Vou juntar às outras que já ganhei. Vai ficar na minha história, nas minhas memórias. A medalha representa também as minhas memórias, boas e más", sublinhou.

A argumentação do Governo é negada, porém, pela UNITA, que considera a data uma "deturpação da história", com base no "apoio de governos de proximidade ideológica", e que constitui "um elemento de referência propagandístico" que "não faz sentido celebrar" num contexto de reconciliação nacional.

"Não faz sentido em Angola comemorarem-se vitórias e derrotas num momento de reconciliação nacional. É um elemento de referência propagandístico. Não aconteceu nada daquilo que formal e oficialmente a propaganda traz", referiu na Sexta-feira à Lusa o líder parlamentar da UNITA, Adalberto da Costa Júnior.

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