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Terá 2019 sido o ano em que a população rompeu o namoro com João Lourenço?

Depois de um primeiro ano de entusiasmo, a relação entre a população e o seu presidente ficou marcada em 2019 pelo desencanto, num país sufocado entre o espartilho da dívida e uma economia débil e ainda sem alternativas ao petróleo.

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A queda brutal do kwanza, novos impostos, manifestações de descontentamento, desemprego, insegurança e criminalidade, fome e seca deixam o país sem saudades do ano que está quase a despedir-se.

Com um novo presidente eleito em Setembro de 2017, após quase 40 anos de reinado do anterior chefe do executivo, José Eduardo dos Santos, a população viu em João Lourenço um sinal de esperança e de mudança, apesar de o país continuar a ser governado pelo mesmo partido de sempre, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).

Mas o afastamento forçado da família dos Santos e os casos judiciais contra antigos todo-poderosos do MPLA foram abrindo brechas no seio do partido com os partidários do presidente a elogiarem a sua luta anti-corrupção e os detractores a criticarem a perseguição dos 'marimbondos', um termo cunhado por João Lourenço para aludir aos corruptos e às forças de bloqueio normalmente associadas aos familiares e próximos do antigo presidente.
Em 2018, a postura do novo presidente que fez da luta contra a corrupção a sua bandeira deixou os angolanos expectantes com o virar de página, mas em 2019 o desânimo instalou-se perante a ausência de soluções para resolver a difícil situação económica do país.

E a eleição de um novo presidente no principal partido da oposição, a União para a Independência Total de Angola (UNITA), após 16 anos de liderança ininterrupta de Isaías Samakuva também agitou as águas da política, com o novo líder Adalberto da Costa Júnior a apostar num "Galo Negro" renovado e ambicioso e declarando-se preparado para disputar o poder ao MPLA nas eleições autárquicas agendadas para 2020 e nas eleições gerais de 2022.

O ano começou com sinais preocupantes para o país. Vários meses sem chover deixaram as províncias do Sul em estado de calamidade e milhões de pessoas com fome e desesperadas por água.

A situação agravou-se mês após mês, com o governo a solucionar pontualmente as emergências, mas com dificuldade em apresentar soluções para mitigar o impacto das alterações climáticas nas zonas áridas do Sul, onde as comunidades viram também os seus tradicionais terrenos de pasto encolher a favor do latifúndio privado.

Com um crescimento demográfico explosivo e uma recessão económica que perdura desde 2016, os angolanos, vítimas de uma taxa de desemprego que ronda os 30% e afecta metade dos jovens do país, não deixaram de cobrar a João Lourenço a sua promessa eleitoral de criar 500 mil postos de trabalho.

O descontentamento estalou em Agosto e levou às ruas de Luanda centenas de jovens em protesto contra o "marimbondo" João Lourenço, numa manifestação onde se viveram alguns momentos de tensão com a polícia.

Dois meses mais tarde, a insatisfação focada nos problemas sociais voltou a fazer-se sentir em Luanda, mas os protestos contra o aumento dos preços e a elevada taxa de desemprego mobilizaram muito menos pessoas.

Subjacente aos protestos esteve a entrada em vigor do IVA, em Outubro, e o seu impacto nos preços, que acentuaram o desânimo.
Apesar de o governo defender os méritos do novo imposto e anunciar medidas de combate à especulação, os angolanos sentiram a perda de valor do kwanza dia após dia, com a desvalorização a atingir quase 40% desde o início do ano, e os preços a evoluírem em sentido contrário, obrigando a mais um aperto no cinto.

Próximo do final do ano, em Novembro, a capital foi varrida por uma vaga de assaltos violentos, junto a dependências bancárias, que culminaram na morte de cidadãos nacionais e estrangeiros, centrando a discussão na relação entre a crise social e económica e a criminalidade, apesar de o presidente João Lourenço ter recusado fazer essa ligação.

Mas se, internamente, os ventos não sopraram de feição, no plano externo, o país viveu mais ano em estado de graça, entre os louvores dos governantes portugueses que se deslocaram ao país africano, reafirmando o bom momento e a relação especial entre os dois estados, como o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva e o secretário de Estado da Internacionalização, Eurico Brilhante Dias, e o apreço mostrado por organizações internacionais como o FMI ou o Banco Mundial, pelas reformas em curso e abertura da economia.

Angola deu também cartas na diplomacia internacional, com João Lourenço a visitar dezenas de países e a receber outras tantas personalidades, mediando também com sucesso, numa cimeira quadripartida, a resolução da tensão militar entre o Ruanda e o Uganda.

No último mês do ano, o embaixador de Angola na Bélgica, Georges Chikoti, foi escolhido como novo secretário-geral do Grupo África, Caraíbas e Pacífico (ACP), vencendo os seus adversários Brave Rona Ndisale, do Malaui, e Chifamba Tadeus Tafirenyika, do Zimbabué, deixando mais uma nota positiva para a diplomacia.

Resta saber se em 2020 a população dará a mesma nota a quem governa o país.

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