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Defesa

Ex-comandante da Guarda Presidencial diz que entregou “malas de dinheiro” ao major Lussati

O ex-comandante da Unidade de Guarda Presidencial (UGP) no Cuando-Cubango, coronel Manuel Correia, disse esta Sexta-feira em tribunal que “entregou várias vezes” ao major Pedro Lussati “malas de dinheiro” com cerca de 25 milhões de kwanzas.

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Segundo Manuel Correia, um dos 49 arguidos do caso Lussati, que falava em sede de interrogatório, o montante, remanescente dos salários dos efectivos da UGP, naquela província, era entregue igualmente, em Luanda, ao co-arguido Edmundo Tchitangufina de forma alternada.

Pedro Lussati e Edmundo Tchitangufina, réu prófugo, explicou o coronel, recebiam os valores "mensalmente por orientação oficial do general Hélder Vieira Dias "Kopelipa", ex-ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente, na era José Eduardo dos Santos.

O oficial interrogado esta Sexta-feira, em tribunal, assumiu que após pagar os salários do efectivo local, em 'cash', a UGP no Cuando-Cubango "sobrava com muito dinheiro", que era guardado em sua residência, "que tinha melhores condições de segurança em relação à unidade", e depois eram transferidos via terrestre, em Luanda, guardado em três ou quatro malas.

"O valor excedente regressava a Luanda, em malas por meio de viaturas, e o processo era assim todos os meses cujo valor rondava os mais de 22 milhões de kwanzas", disse o oficial das Forças Armadas Angolanas (FAA).

Explicou que os efectivos da unidade eram pagos presencialmente e que o restante que não aparecia e nem assinava a folha de salário "era o pessoal de baixa visibilidade", que davam azo ao excedente salarial.

Manuel Correia disse também que os generais Eusébio de Brito e António Mateus Júnior de Carvalho "Dilangue" eram os outros beneficiários do excedente salarial da UGP do Cuando-Cubango, cujas malas de dinheiro eram entregues aos generais nas bombas de combustível, em restaurantes ou em locais indicados por estes, em Luanda.

Os generais Eusébio de Brito e "Dilangue", explicou, recebiam ordens do general "Kopelipa".

Sobre o destino dos salários de efectivos desertores e mortos a nível da unidade, o ex-comandante contou que a unidade tinha o registo de 200 defuntos, cujos salários eram entregues às respectivas famílias, negando descaminho do montante.

Este co-arguido do mediático caso Lussati, disse também, em sede do tribunal, que a sua acção era pautada no estrito cumprimento de ordens superiores, referindo que "uma ordem superior, com ou sem documento, era para cumprir".

Questionado pelo juiz-presidente, Andrade da Silva, sobre o que ensinava a academia militar quanto ao cumprimento de uma ordem, o coronel Manuel Correia respondeu: "É não negar o que ordena o superior hierárquico".

No decurso do seu interrogatório, o oficial superior das FAA, que também dirigia o Batalhão de Transportes Rodoviários do Cuando-Cubango e a Unidade de Desminagem da UGP local, afirmou igualmente que alguns efectivos, sob seu controlo, "desenvolviam actividades de mobilização política em favor do partido MPLA", no poder.

O "Batalhão de Transportes Rodoviários esteve desdobrado em grupo de mobilizadores e dentro deste grupo também saíam mobilizadores de militantes do MPLA, porque depois o trabalho principal da unidade ficou sem efeito", frisou.

O grupo de efectivos mobilizadores, que considerou de activistas políticos, "desdobravam-se nos municípios e comunas da província do Cuando-Cubango, sul de Angola, em actividade em favor do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola).

Manuel Correia negou que pagava salários ao efectivo do 6.º e 8.º batalhões, referindo que "nunca teve contacto com o pessoal dos referidos batalhões".

Confirmou a existência de parentes de efectivos da UGP do Cuando-Cubango na folha de salário da unidade e referiu que "este alistamento era externo e feito com base do trabalho político".

Na sua exposição, o co-arguido oficial das FAA, deu a conhecer igualmente que havia funcionários do Banco de Poupança e Crédito (BPC), enfermeiros e funcionários do governo da província do Cuando-Cubango inseridos na folha de salário da UGP.

"Estes, num total de 104 pessoas com dupla efectividade, foram inseridos na folha de salário porque o recrutamento era feito fora da unidade, por via dos activistas políticos, e estes faziam a listagem", disse.

"Apercebi-me apenas que eram bancários por causa do descontentamento de alguns efectivos da unidade, daí que tinha de fazer o controlo físico e só assim foram retirados (da folha salarial)", justificou.

Interrogado se também beneficiava do excedente do salário da unidade, o coronel Manuel Correia negou, considerando que o seu património, entre viaturas, hotéis, fazenda, bar, estação de serviço, bomba de combustível e outros, foi adquirido fruto do seu empreendedorismo e que tinha como justificar a origem dos bens.

A acusação refere que o património do coronel "é incongruente e que com salário que aufere não conseguiria adquirir os referidos bens".

O caso Lussati, onde estão arrolados 49 arguidos, tem como rosto visível o major Pedro Lussati, afeto à Casa Militar da Presidência da República, tido como cabecilha do grupo, detido na posse de milhões de dólares, euros e kwanzas guardados em malas, caixotes e em várias viaturas.

O advogado de Pedro Lussati, reagindo à intervenção do coronel Manuel Correia, colocou uma série de questões ao co-arguido, mas o oficial recusou-se a responder a grande parte delas.

Francisco Muteka solicitou mesmo ao tribunal uma acareação entre Manuel Correia e Pedro Lussati, mas o juiz indeferiu o seu pedido.

Mais de 200 declarantes estão arrolados neste megaprocesso cujas audiências de julgamento, sob tutela do Tribunal da Comarca de Luanda, decorrem no Centro de Convenções de Talatona.

Os arguidos, entre os quais oficiais das FAA e civis, são indiciados dos crimes de peculato, associação criminosa, recebimento indevido de vantagem, participação económica em negócio, abuso de poder, fraude no transporte ou transferência de moeda para o exterior, introdução ilícita de moeda estrangeira no país, comércio ilegal de moeda, proibição de pagamentos em numerário, retenção de moeda, falsificação de documentos, branqueamento de capitais e assunção de falsa identidade.

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