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Angolanas vendem de tudo nas ruas de Luanda sempre de olho nos fiscais

De bacia à cabeça e o filho às costas, as zungueiras de Luanda fazem-se à rua às primeiras horas da manhã, percorrendo quilómetros na venda ambulante, negócio que alimenta famílias inteiras, mas por entre a já habitual fuga aos fiscais.

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Às primeiras horas do dia, Clementina da Silva, de 29 anos, já está na "zunga", como é conhecida a venda ambulante em Angola, prática ilegal, nomeadamente pelas dificuldades que provoca no trânsito ou por se tratar de economia informal.

A venda da água mineral que transporta à cabeça permite-lhe levar para casa, todos os dias, pouco mais de 1000 kwanzas de lucro, alimentando seis filhos e o marido. "É sofrimento, meu irmão", conta à agência Lusa, ao mesmo tempo que explica não ter dinheiro para comprar uma banca num dos vários mercados da capital, por entre a boa disposição típica destas mulheres.

Resta-lhe, como a Albertina Dias, de 28 anos, improvisar uma banca num qualquer passeio, chamando a atenção dos clientes, mas tentando passar despercebida aos fiscais. "Há dias que [o negócio] anda um pouco, há outros que não compensa", conta esta zungueira, que vende bolachas pelas ruas de Luanda, por onde fica entre as 07h00 e as 20h00, todos os dias, deixando em casa os seus cinco filhos.

Noutra zona de Luanda, e já com seis horas de caminhada nas pernas, Antónia da Cunha, de 30 anos, leva a bacia cheia de frescos. A "correr bem", deverá regressar com 30.000 kwanzas, grande parte para pagar o "negócio" que comprou para vender na rua. Em casa tem cinco filhos e o marido para alimentar, na rua é um olho no produto e outro no fiscal, que pode chegar a qualquer momento, apreendendo a mercadoria que muitas deixam para trás na correria. Isto porque as poucas bancas livres para vender nos mercados "são muito caras", conta, sempre desperta para fazer o melhor negócio com os clientes por entre a conversa.

É como Joana ‘Mãezinha', que tem 40 anos e que carrega à cabeça, na bacia, os seus legumes. O problema é que ao fim de uma manhã ainda não fez negócio. "Não tem clientes, as coisas têm subido [de preço]", confessa, admitindo "muitas dificuldades" para conseguir levar de comer para casa, onde estão seis filhos, a mais velha a tratar das refeições dos irmãos. "Não estão a deixar vender na rua. Os fiscais dão-nos muita corrida, perdemos o negócio", diz, espreitando as movimentações à volta, não vá ser surpreendida.

A chegada em força das grandes superfícies ao centro de Luanda também complicou a vida a quem vende na rua, em qualquer esquina, como o calçado da zungueira Edna Maria. Seja de homem ou de mulher, tem oferta suficiente para fazer 10.000 kwanzas por dia, mas só uma pequena parte é lucro. "Eu trabalhava, mas depois vi que o bocado que eu ganhava não chegava para nada, por isso vim para ser zungueira. Por enquanto, eu gosto porque não tenho um emprego fixo", admite Edna, já mãe de quatro filhos aos 23 anos.

Debaixo de um sol escaldante durante a tarde, procurando sombra nas entradas dos prédios ou junto às palmeiras, Maria Divina, de 20 anos, e uma filha de três anos que já leva para a "zunga" da bijuteria, a sua "especialidade" nas ruas de Luanda, sabe da ilegalidade do negócio. "Eu sei que sim, mas não tenho local para vender. Não tenho dinheiro para comprar uma bancada no mercado", atira.

Elsa Constantina é pouco mais velha, tem 23 anos, mas já três filhos. Pelas 07h00, todos os dias, já anda por Luanda a vender garrafas velhas de refrigerante com o mel que compra nas províncias. Contas feitas, consegue levar menos de 8000 kwanzas por dia, após muitos quilómetros nas pernas, a única solução para milhares de mulheres que trocam as províncias pela capital. "A situação está mal, os empregos não aparecem, não dá para ficar em casa porque é preciso pagar as propinas das crianças [escola], a doença [medicamentos]. Temos de vender mesmo na rua", desabafa Elsa.

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