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Angola está “desconfortável” e quer solução “mais profunda e duradoura” para a dívida

A secretária de Estado do Orçamento admitiu que o país está "desconfortável" com o nível de dívida e defendeu que a suspensão dos pagamentos não é suficiente, sendo necessária uma solução "mais profunda e duradoura".

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"Não usamos a palavra 'distress', mas não estamos muito confortáveis com o nível de dívida que temos", disse Aia-Eza Nacília Gomes da Silva, durante a sessão de lançamento do relatório do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) sobre as perspectivas económicas para este ano.

A discussão de uma hora e meia, que envolveu também o Prémio Nobel da Economia Joseph Stiglitz e o presidente do BAD, Akinwumi Adesina, para além dos outros representantes financeiros do continente, passou em revista as fragilidades da Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI) e a necessidade de uma solução abrangente que envolva os credores privados, que detêm a parte mais cara da dívida dos países africanos.

"Os países desenvolvidos estão a lidar com a crise de um maneira muito diferente da nossa, com um ambiente mais apoiante, têm enormes montantes de dinheiro que injetaram na economia, e nós recebemos bem e apoiámos a DSSI, mas não posso concordar mais [com os outros oradores da conferência] que esta iniciativa servia para os países quando se pensava que o ambiente de pandemia não ia durar muito tempo", acrescentou a governante, que é responsável pelo Orçamento e Investimento Público no Ministério das Finanças.

"Chegados a esta nova realidade, mesmo com as vacinas, ninguém sabe como vai ser a vida, por isso é tempo de pensar numa solução mais profunda e duradoura do que a DSSI, que sim, ajuda, mas não chega", concluiu Aia-Eza da Silva.

A intervenção da governante decorreu na sessão de lançamento do relatório do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) sobre as 'Perspectivas Económicas para África 2021', que tem como tema 'Da resolução da dívida ao crescimento: o caminho de África', e que foi lançado em formato virtual a partir de Abidjan.

Nele, o BAD estima um crescimento de 3,2 por cento para o continente, ligeiramente acima da previsão de 3,1 por cento apontada para o crescimento económico de Angola em 2021.

Joseph Stiglitz defendeu que os contratos que regulam a dívida pública aos credores privados deviam ser refeitos devido às consequências devastadoras da pandemia de covid-19, nomeadamente em África.

"Se alguma vez houve uma alteração em que o princípio legal de 'force majeure' [força maior] e necessidade foram relevantes, é este", argumentou o economista norte-americano durante o lançamento do relatório.

"Quando eventos como este da pandemia acontecem, tem de se reestruturar os contratos, não se pode obrigar as pessoas a honrarem contratos que não têm em conta os efeitos inconcebíveis de uma pandemia. Isto é precisamente o tipo de circunstância que os governos nos países avançados usam em contingências deste género, e é o que deve ser feito de uma forma mais geral", disse Stiglitz depois de defender que a suspensão dos pagamentos de dívida não é suficiente.

"Ninguém percebeu quão profunda ia ser a pandemia, em abril do ano passado pensou-se que a suspensão dos pagamentos de dívida [através da DSSI] até Junho seria suficiente, mas já dura há um ano e percebeu-se que uma moratória não é suficiente, é preciso uma reestruturação", acrescentou.

O continente "deve recuperar da sua pior recessão económica em meio século devido à pandemia, crescendo 3,4 por cento em 2021, que se segue a uma contração de 2,1 por cento no ano passado", lê-se no relatório.

A DSSI é uma iniciativa lançada pelo G20 em Abril do ano passado que garantia uma moratória sobre os pagamentos da dívida dos países mais endividados aos países mais desenvolvidos e às instituições financeiras multilaterais, com um prazo inicial até dezembro de 2020, que foi depois prolongado até Junho deste ano, com possibilidade de nova extensão por seis meses.

Esta iniciativa apenas sugeria aos países que procurassem um alívio da dívida junto do sector privado, ao passo que o Enquadramento Comum, aprovado pelo G20 em Novembro, defende que é forçoso que os credores privados sejam abordados, ainda que não diga explicitamente o que acontece caso não haja acordo entre o devedor e o credor.

A proposta apresentada pelo G20 e Clube de Paris em Novembro é a segunda fase da DSSI, lançada em Abril, e que foi bastante criticada por não obrigar os privados a participarem do esforço, já que abriria caminho a que os países endividados não pagassem aos credores oficiais e bilaterais (países e instituições multilaterais financeiras) e continuassem a servir a dívida privada.

Este Enquadramento pretende trazer todos os agentes da dívida para o terreno, incluindo os bancos privados e públicos da China, que se tornaram os maiores credores dos governos dos países em desenvolvimento, nomeadamente os africanos.

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