Ver Angola

Cultura

Jonuel Gonçalves lança “E se Angola tivesse proclamado a independência em 1959”

Uma Angola a conquistar a independência em 1959, 16 anos antes da realidade, era o sonho de alguns angolanos, tema assumidamente retratado pelo investigador, escritor, jornalista e comentador angolano Jonuel Gonçalves num livro em que idealiza tal possibilidade.

:

“E se Angola tivesse proclamado a independência em 1959”, recentemente lançado pela editora Guerra e Paz, cobre um período de quase três meses – entre 15 de Outubro de 1959 e 11 de Janeiro de 1960 -, quando alguns angolanos foram ‘beber’ no Gana de Kwame Nkrumah os ideais da libertação do jugo colonial europeu em África.

Em declarações à agência Lusa, o autor, também comentador da RDP África sob o nome de José Gonçalves, realçou que, em 1959, houve a detenção de numerosos grupos de nacionalistas angolanos, surgindo então vozes a defender a luta armada para a obtenção da independência.

Nessa altura, referiu, o poder militar colonial em Angola era “débil”, pelo que seria a altura ideal para se dar início à luta armada, ideia que a elite intelectual angolana começa a ver com simpatia, face à “vontade férrea” do regime liderado por António Oliveira Salazar em manter as colónias portuguesas em África.

A partir deste cenário, Jonuel Gonçalves, que reparte a sua vida entre Brasil, onde é professor universitário, Portugal e Angola, constrói uma narrativa baseada no conceito “what if?” (e se?), consagrado na historiografia de língua inglesa, em que procura saber o que teria acontecido se esses idealistas tivessem avançado com a intenção.

Para Jonuel Gonçalves, que vivenciou todos esses momentos, a questão é simples: “com uma Angola independente em 1959 seria muito o sofrimento poupado ao povo angolano”, questionou o autor que, ao longo dos quase 90 dias dos eventuais acontecimentos, escreve um diário do desenrolar da acção.

A iniciativa pensada em 1959 só viria a ser levada a cabo a 4 de Fevereiro de 1961, com o ataque à prisão de Luanda para libertar dezenas de nacionalistas detidos pela PIDE, polícia política portuguesa, desencadeando depois um conflito que só terminaria com a revolução portuguesa de 25 de Abril de 1974.

Questionado pela Lusa sobre porque falhou a ideia em 1959, Jonuel Gonçalves respondeu que “faltou a autorização dos mais velhos”.

“Não tivemos apoio político dos mais velhos. E não iríamos avançar sozinhos por duas razões. Tínhamos a noção de que, politicamente, a nossa capacidade de mobilização era limitada. Com 50 homens não conseguiríamos. Depois, se avançássemos, logo após os primeiros sucessos, partiríamos para o contacto diplomático”, disse.

“Havia uma boa representação internacional em Luanda com os consulados dos Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha. Mas nada foi por diante porque não tivemos o apoio das figuras decisivas que achavam que estávamos a ver mal as coisas, estávamos a exagerar”, salientou.

Entre os “mais velhos, com peso político”, figuravam personalidades ligadas ao grupo da antiga UPA (União dos Povos de Angola), como Holden Roberto, mas também outros, como Mário de Andrade, Viriato da Cruz e até Amílcar Cabral que, na altura (1958/59), vivia em Luanda e que foi muito importante para a formação do nacionalismo angolano.

“E havia também, depois, líderes naturais, como o cónego Amaral das Neves, o advogado Diógenes Boavida e Câmara Pires, ligado ao desporto, mas muito popular. Demóstenes de Almeida e Amílcar Cabral até eram nomes que se pensava para um Governo”, adiantou Jonuel Gonçalves.

José Manuel Gonçalves, natural de Luanda, onde nasceu em 1943 (74 anos), passou por várias estruturas e formas de luta pela defesa da liberdade e democracia contra a tentação do poder e das ditaduras: o movimento independentista, os bastidores da guerrilha, a assunção do poder pelo MPLA, as batalhas da guerra civil.

O também actual professor na Universidade Federal Fluminense, no Rio de Janeiro (Brasil) tem vasta obra bibliográfica publicada em Angola.

“Contos no Fogo Cruzado a Sul” (recuperado em 2017), “Franco Atiradores” e “Relatos de Guerra Extrema”, ambos publicados em 2010, Jonuel Gonçalves é autor de outras obras, como “A Economia ao Longo da História de Angola” (2011), “A Economia de Angola nos Espaços Austrais” (2014) e “A Ilha de Martim Vaz” (2015), tendo colaborado ainda no livro de história intitulado “África no Mundo Contemporâneo” (2015).

Permita anúncios no nosso site

×

Parece que está a utilizar um bloqueador de anúncios
Utilizamos a publicidade para podermos oferecer-lhe notícias diariamente.