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Fernando Pacheco: grandes projectos agravam problemas climáticos

O engenheiro agrónomo Fernando Pacheco criticou o recurso aos grandes projectos que podem agravar, em vez de mitigar, os problemas climáticos em Angola, por falta de conhecimento e estudos detalhados.

: Nsosi Suamino
Nsosi Suamino  

Fernando Pacheco, que falou à Lusa a propósito da Cimeira Africana sobre o Clima, que se iniciou em Nairobi, disse que já se sentem os efeitos das mudanças climáticas em Angola, principalmente no sul, onde os episódios de falta de chuva se têm vindo a agravar nos últimos anos.

Sobre as secas cíclicas que se vivem nas províncias do sul, como o Cunene ou o Namibe, salientou que se trata de um agravamento do que se vivia antes, já que Angola tem uma grande diversidade de regimes pluviométricos e no sudoeste, tradicionalmente, chovia pouco.

“É uma zona que pode ser considerada semiárida, mas relativamente a outros países como Moçambique, estamos numa situação muito melhor. Mesmo os fenómenos de excesso de chuva não têm comparação”, disse o especialista.

Quanto às políticas governamentais adoptadas para mitigar os efeitos das alterações climáticas, considerou que, “infelizmente”, não é possível dizer “que se esteja no bom caminho”.

No entender do agrónomo, os “grandes projectos” são uma solução que não resolve e pode agravar ainda mais os problemas, provocando a destruição de ecossistemas e modos de vida ancestrais.

Como exemplo apontou o canal do Cafu, construído para resolver os problemas da seca no Cunene, mas cuja obra apresentou já diversas falhas, tendo as chuvas danificado a infraestrutura menos de um ano após a inauguração, e o anunciado projecto de irrigação que pretende replicar o Vale de São Francisco, no Brasil.

“Este projecto de que se fala e que pretende transformar-se num novo vale de São Francisco tem muito pouco para dar certo porque se avança para um projecto sem os necessários estudos dos solos e muito menos envolvendo a população”, criticou o engenheiro agrónomo.

“São populações que se dedicam à pastorícia, feita de acordo com regras muito rudimentares, mas adaptadas àquelas condições. Não há nenhuma solução que os vá transformar em grandes agricultores. O que vai acontecer é que se vão instalar por ali agricultores que não são da região”, declarou.

Para o engenheiro e co-fundador da ADRA (Associação para o Desenvolvimento Rural e Ambiente), isso não seria um problema se o projecto contemplasse populações locais, “mas não é o que tem acontecido em Angola”.

Fernando Pacheco citou outras experiências em regiões semiáridas brasileiras que considera terem melhor resultado, como a construção de cisternas subterrâneas para recolha e acumulação de água da chuva, defendendo “ações mais pequenas e mais baratas” e com tecnologia simples.

“Nós não temos capacidade para gerir projectos de grande dimensão”, disse, apontando o caso da Biocom, empresa com capitais angolanos e brasileiros, que fornece cerca de um terço das necessidade de açúcar do país, que considerou “um bom projecto do ponto de vista da eficácia”, mas um “desastre”em termos de eficiência, sobrevivendo apenas com injecções de dinheiro do Estado.

Alertou também para a necessidade de preservar os ecossistemas, que “se não forem bem cuidados, apresentarão problemas muito sérios” e que considerou uma questão premente para a África intertropical.

“Quando se fala de florestas, não é apenas a devastação causada pelos grandes interesses económicos, estamos a falar também do uso da biomassa por parte da população que vive na pobreza e não tem outras fontes de energia”, salientou.

A Cimeira Africana sobre o Clima junta, no Quénia, Chefes de Estado e de Governo da União Africana e das Nações Unidas, bem como representantes da sociedade civil. Angola é representada pela vice-presidente da República, Esperança da Costa.

A primeira Cimeira do Clima em África, liderada pelo Presidente queniano, William Ruto, com o apoio da União Africana, vai abordar a crescente exposição às alterações climáticas e os custos associados a nível global e de África, em particular. Sob o lema "Impulsionando o crescimento verde e soluções de financiamento climático para África e o mundo”, o Fórum vai, também, centrar-se na apresentação de soluções inovadoras de crescimento verde e de financiamento do clima em África e no mundo.

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