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Descontentamento e protestos em Luanda marcam três anos de governo de João Lourenço

Centenas de angolanos saíram no Sábado à rua para mostrar a sua insatisfação com o governo e exigir mais empregos, uma das promessas eleitorais de João Lourenço, que assinalou três anos como Presidente de Angola.

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Convocada por vários grupos de activistas e da sociedade civil em 12 províncias de Angola e alguns países da diáspora, a marcha do desemprego juntou sobretudo jovens e estudantes que saíram pelas 12h30 do cemitériode Santana, após negociarem com a polícia o trajecto a percorrer, em direção ao Largo da Independência (1.º de Maio).

Entoando palavras de ordem como "Liberdade Justiça, Emprego, Educação", muitos dos jovens exibiam cartazes caseiros com mensagens de revolta e rejeição do partido do poder, o MPLA: "Angola é um país governando por assassinos", lia-se num deles. "Promessa não se come", criticava outro. "MPLA: assassino de sonhos", acusava outro cartaz, enquanto os 500 mil empregos prometidos pelo presidente eram a mensagem escrita noutro cartaz.

Alguns dos jovens vestiam t-shirts brancas com os dizeres "O desemprego marginaliza" e invocando o art.º 76da Constituição. "O emprego é um direito consagrado na Constituição da República", reivindicava Laurindo Mande, estudante de Direito na Universidade Jean Piaget.

Em declarações à Lusa, o jovem de 22 anos salientou que, além de não ter sido criado emprego, "houve um agravamento da vida financeira e social da juventude" e considerou que o governo devia investir mais no empresariado.

Donito Carlos, da Plataforma de Intervenção do Kilamba Kiaxi, acusou João Lourenço de não ter criado "nem 10 por cento do emprego que prometeu" e fez um balanço negativo da governação: "Regrediu nas liberdades individuais, não cumpriu as promessas, o combate à corrupção é um paliativo em que escolheu pessoas da sua conveniência. Em suma, é um desastre. Os angolanos sabem que nada mudou, o regime é o mesmo, apenas mudaram as figuras".

O desfile foi engrossando ao longo do percurso, quando se juntaram aos jovens dezenas de "zungueiras", também elas insatisfeitas com as condições de vida. "Zungueira é nossa mãe, não batam nas zungueiras", cantaram em dada altura.

À medida que a marcha avançava, as vozes tornaram-se também mais altas e revoltadas gritando "João Lourenço se prepara" e "2022, vais gostar", numa alusão às eleições gerais marcadas para esse ano.

Muitos iam-se juntando aos manifestantes no percurso, fazendo vídeos em directo com os telemóveis e partilhando nas redes sociais, numa marcha que seguiu sempre em passo ritmado.

Os manifestantes chegaram perto das 14h00 ao Largo da Independência, local combinado para o término e onde eram esperados pela polícia montada, brigadas caninas e polícias de choque, com a missão de conterem o protesto e ,apesar das provocações, não reagiram.

Enquanto alguns exaltados tentavam furar a barreira policial, elementos da organização da marcha tentavam controlar os ânimos, apelando ao cumprimento das orientações policiais.

Osvaldo Caholo, o único militar dos "15 + 2", relativo ao caso dos 17 activistas angolanos condenados em 2016 por "atos preparatórios de rebelião", garantia à Lusa: "Vamos fazer o máximo para que não haja enfrentamentos com a polícia".

Sobre os três anos de governo de João Lourenço, o activista afirmou que "houve apenas uma mudança de moscas, o poder é como se fosse um esterco". "Enquanto Angola for refém dessas máfias não tenho esperança. O problema de Angola não é José Eduardo dos Santos nem João Lourenço é a máfia do MPLA", realçou.

Para Osvaldo Caholo, "o MPLA finge que é democrático, a UNITA finge que é democrática, a única verdade é o sofrimento do povo angolano".
Magui António, zungueira de 28 anos, também se juntou à marcha: "Estamos a sofrer", lamentou, merecendo a concordância das colegas de zunga que rapidamente se juntam a sua volta num coro de queixas: falta emprego, faltam escolas, faltam hospitais, faltam mercados, dizem as vendedoras, queixando-se dos fiscais que lhes "roubam o negócio" (produtos para venda).

Já no Largo das Heroínas, para onde os manifestantes seguiram e se concentraram entretanto, para pernoitar e fazer uma vigia, Fernando Sakuela Gomes desabafa: "Em tempo de covid, o importante é ter pão na mesa e não PIIM [programa de investimento em infra-estruturas nos municípios] na estrada".

"A nossa intenção é efectivamente a democracia. Queremos erguer a república dos cidadãos e não a república dos militantes", referiu à Lusa o jovem activista do Projecto Agir Cacuaco.

A manifestação terminou de forma algo abrupta quando um grupo de jovens iniciaram um tumulto e arremessaram pedras, obrigando a intervenção policial e ao lançamento de gás lacrimogéneo para conter os distúrbios e dispersar os mais agitados.

A polícia confirmou que alguns jovens vão ser levados para a esquadra e identificados, sendo depois postos em liberdade.

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