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Gastronomia

Chef Ricardo Braga: “A gastronomia não é só uma paixão mas sim encarar a vida de forma diferente”

Tem 33 anos é natural de Lisboa e estudou na Associação de Cozinheiros e Pasteleiros de Portugal. Passou por vários restaurantes e hotéis até chegar a Luanda, à cozinha do Caribe, onde dá nome à cozinha de autor do menu de degustação. Foi um dos três chefs angolanos que em Paris tiveram a honra de cozinhar para a Academia Internacional de Gastronomia, com grande sucesso e reconhecimento, apresentando a gastronomia angolana à alta sociedade. Ricardo Braga, o chef que afirma que a sua paixão pela cozinha não tem limites, e para quem cozinhar é conhecer o mundo, admite que “o futuro da gastronomia angolana passa por uma fusão e troca de experiências, a nível mundial”.

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Ricardo fale-me um pouco de si... Onde nasceu e cresceu, como foi a sua infância, onde e o que estudou, que idade tem...

Nasci em Lisboa num bairro chamado Camboja, situado na zona de Chelas. Foi onde cresci e aprendi a ser um homem mais forte, psicologicamente e fisicamente, devido às dificuldades que fui encontrando e ultrapassando. A ajuda e persistência da família foi crucial para o meu desenvolvimento, repartido entre uma outra zona lisboeta, Olivais e Moscavide.

Conto já com 33 anos e estudei em diversas escolas, como a Damião de Gois, a Eça de Queirós, no secundário, e a D. Dinis onde tirei um curso de Marketing, mas o meu maior orgulho foi na Escola Profissional Associação de Cozinheiros e Pasteleiros de Portugal, onde cursei durante três anos.

Quando surgiu o gosto pela cozinha? Pode dizer-se que é uma paixão?

O gosto pela cozinha posso afirmar que sempre esteve presente, não sendo só pelo prazer de comer bem, mas pelo facto de a ter descoberto e perceber que a vida fazia sentido. Mas surgiu inesperadamente… Quando me escrevi num curso de informática, que por coincidência do destino não havia vaga, e fui automaticamente transferido para o de cozinha. Inicialmente o primeiro impacto foi negativo. Mas é uma história que confirma o ditado, nada acontece por acaso. Posso dizer que não é só uma paixão, mas é encarar a vida de forma diferente.

Que tendências segue na sua cozinha? E que alimentos mais gosta de confeccionar?

O estilo e conceitos são os mais variados possíveis. Gosto de ter um conhecimento diversificado e universal. Pois a vida de um cozinheiro é por vezes adaptar-se ao conceito das casas por onde passa, e depois aplicar o seu conhecimento.

Os alimentos que mais prazer me dão a confeccionar são os que estão no seu período de frescura máxima e na sua estação.

O gosto, prazer e amor pela cozinha para mim não tem limites. Até agora tenho ido a vários sítios pelo mundo fora porque, como costumo dizer, cozinhar é conhecer o mundo.

Até onde é que o gosto pela culinária o levou? Passou por vários restaurantes? Que experiências recorda?

Sim, passei por vários restaurante e hotéis como o Hotel Ritz e o Hotel Meridien, ambos em Lisboa, o Hotel HCTA Luanda, o Restaurante Bonsai, de cozinha japonesa, em Lisboa, o Restaurante Flor de Sal, cozinha de autor em Lisboa, e o Restaurante Caribe, em Angola.

Dentro de mim guardo um carinho especial por todos eles, e se o tempo voltasse atrás repetia tudo novamente. Passei por vários momentos de alegria, sofrimentos, tristezas, angústias e até ponderei abandonar a carreira, mas tenho uma maneira de estar e de pensar na vida que, tudo o que posso imaginar que será impossível e difícil, tento tornar possível e fácil.

Neste momento onde é possível degustar os seus pratos e as suas criações?

Actualmente estou no emblemático restaurante Caribe em Luanda, onde fica o convite para poder degustar e se atrever a entrar nos dias temáticos, do menu de degustação de cozinha de autor do Chef Ricardo Braga.

Considera Angola um bom país para estar ligado a esta profissão?

Considero que sim, mas tudo depende do objectivo de cada um. Angola tem todas as condições para ser uma potência dentro da África subsariana. As condições climatéricas fazem com que o produto na sua terra se reproduza a uma velocidade incrível. Perto da costa sobre o oceano atlântico do sul, onde as alternativas e variedades são muitas, os cozinheiros e restaurantes sobrevivem de uma estabilidade, variedade, e alternativa de produtos. Acredito que se investirem em todo este potencial, com o que Angola nos dá na agricultura e na pesca, seriamos todos mais felizes. O país tem que se virar para outros recursos a nível de sustentabilidade, que certamente passará pelo turismo, sendo uma grande referência do turismo, a sua gastronomia.

Gosta da cozinha nacional ou prefere a gastronomia de outros países?

Dentro da gastronomia angolana gosto de algumas coisas, e outras nem por isso. Mas o mesmo acontece com a gastronomia de outros países. Sou uma pessoa que prova de tudo um pouco, e o que realmente gosto é de sabores que façam sentido, e produtos que ninguém dá valor e vamos a descobrir que é rico em vários aspectos. O futuro da gastronomia angolana certamente passará por uma fusão e troca de experiências a nível mundial.

Para si, o que é que torna a cozinha angolana tão especial?

A cozinha angolana está em constante evolução. Temos um leque enorme de profissionais e apaixonados pela cozinha. Temos tido uma constante ligação uns com os outros, e os temas principais são sempre os produtos nacionais, descobrindo-os e explorando-os de diversas maneiras. Falando mesmo de cozinha angolana ainda há pouco a dizer, e o que a torna tão especial é saber que ainda temos muito trabalho pela frente.

A distinção do restaurante com uma estrela Michelin é importante para si? Considera-a como um reconhecimento do seu trabalho?

A distinção de uma estrela Michelin é um assunto muito complexo. Os chef’s vivem sob uma pressão tao alta que desejam que os filhos não sigam as suas pegadas. Procuram superar os clientes, os críticos a as próprias equipas. Têm de estar atentos aos mais pequenos detalhes. Nada pode falhar. Até porque nunca sabem se o próximo cliente que entra é um inspector do guia Michelin. Depois de o chef franco-suíço Benoît Violier ter sido encontrado morto em casa, a notícia caiu que nem uma bomba no mundo da alta cozinha. Dirigia o restaurante do L’Hotel de Ville, na Suíça, espaço distinguido com três estrelas Michelin, e considerado em Dezembro o melhor do mundo pelo guia francês La Liste.

Ser chef é muito mais do que cozinhar, é uma função complexa e completa. Além disso os clientes hoje são informados, exigentes e criteriosos e exigem qualidade e perfeição ao detalhe. Isso é um desafio constante e diário. Será um reconhecimento de superação. Contudo, será sempre um sonho para qualquer cozinheiro ser distinguido com uma estrela Michelin, mas há outras distinções que são tão ou mais gratificantes para nós. Nós os cozinheiros vivemos para servir, agradar e transmitir novas experiências ao cliente. O maior prémio que nos podem dar será a fidelização dos clientes.

Foi um dos três chefs que cozinhou em Paris, para a Academia Internacional de Gastronomia, sendo que Angola foi o primeiro país africano a fazê-lo. Como foi esta experiência? O que sentiu ao ter a oportunidade de apresentar a gastronomia angolana à alta sociedade?

Já não é a primeira vez que represento Angola fora do território nacional. Fui convidado por um grande chef nacional, o Chef Helt Araújo, para fazer parte da equipa dele num jantar em Madrid, Espanha. Não teve a divulgação desejada por nós, por parte da comunicação social, mas com ou sem ajuda quando tem que acontecer acontece, e foi o que aconteceu! O mais importante foi dignificar e mostrar ao mundo que Angola não é só funge.

Após esse, surgiu novamente o convite para que com o Chef Helt e o Chef Bruno, fossemos fazer o que mais nenhum país africano tinha feito. Após ter entrado para a Academia Internacional de Gastronomia, o próximo desafio, a convite dos mesmos, era fazer um jantar que todos os anos é elaborado por um país que pertence à Academia em França, onde há quem diga que foi, e é, o país onde a gastronomia da cozinha moderna ganhou forma, precisamente num hotel de um restaurante com três estrelas Michelin, distinguido como o melhor hotel de França em 2015. O desafio era tremendo. A experiência foi fantástica e não podia ter corrido melhor. As condições foram fantásticas e a colaboração, camaradagem e disponibilidade também, e o resultado foi perfeito. Senti-me um felizardo por poder fazer parte de uma grande equipa, em que as estrelas mais sonantes éramos nós os três. Mas houve mais três pessoas, que não posso deixar de frisar: Sara Sardinha, Emília Abrantes, e Angela Barros, que foram incansáveis para o sucesso de todos, em mostrar o trabalho e a potência de Angola.

O que é que ainda está por fazer na carreira do Chef Ricardo Braga?

Na carreira do Chef Ricardo Braga enquanto houver saúde o limite é o céu, e é deixar os sonhos acontecer.

Para terminar, cozinha para viver ou vive para cozinhar?

Sem dúvida vivo para cozinhar.

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