Para Inglês Pinto, o "vício" da acta de apuramento nacional das eleições de 24 de Agosto, que não especifica os votos vencidos dos comissários nacionais, "não deve ser percebido como uma ilegalidade ou uma violação grosseira de lei".
"Não é ilegalidade do acto, agora o formalismo tem de ser cumprido, isso tem de ser expresso na declaração de voto e evidentemente foi decidido por maioria, agora não digo que houve uma violação grosseira da legalidade", afirmou esta Terça-feira o jurista em entrevista à Lusa.
"É o problema de não cumprimento de lei que leva a um clima de suspeição e nós temos que ter muito cuidado com o rigor jurídico formal, porque este ambiente, conforme está, se houver falhas em algum aspecto jurídico formal, as pessoas levantam situações de suspeição e os juristas têm de estar conscientes disto", notou.
No entender do conhecido jurista, antigo bastonário da Ordem dos Advogados, "existem razões de queixas", sobretudo "pelo não cumprimento dos pressupostos jurídicos formais" na acta.
"Isso agora quem vai fazer análise é que pode verificar se é suficientemente idóneo este facto, para questionar o projecto no seu todo ou apenas um reparo da análise crítica do desempenho do órgão [CNE]", observou.
O presidente da CNE, Manuel Pereira da Silva, divulgou na Segunda-feira a acta de apuramento final das eleições gerais de 24 de Agosto, que proclamou o MPLA e o seu candidato, João Lourenço, como vencedores com 51,17 por cento dos votos, seguido da UNITA com 43,95 por cento.
Na reunião plenária, que aprovou a acta final, estiveram apenas presentes 13 dos 17 membros do plenário, sendo que apenas 11 assinaram a acta e dois comissários votaram contra, nomeadamente Rafael Daniel Aguiar e Adriana Chitula Séssipo.
A acta, no entanto, não apresenta as declarações de voto dos respectivos comissários.
Por razões "devidamente justificadas", explicou o presidente da CNE, "estiveram ausentes (da reunião plenária) os seguintes membros: Isaías Celestino Chitombi, Maria Marcelina Lucanda Pascoal, Domingos Inácio Francisco e, injustificadamente, Jorge Manuel Mussonguela", todos indicados pela oposição.
Em face das ausências de alguns comissários e não ratificação da acta por parte de outros, Inglês Pinto entende que a acta foi aprovada por maioria.
"Na realidade, deve ser por consenso e quando não há consenso decide-se por maioria. Quem tem voto vencido pode, e deve, fazer declaração de voto e deve constar da acta, tal como um acórdão dos tribunais, esse é o princípio básico", frisou.
A acta "passou, sim, por maioria absoluta, mas tem que constar isso e os votos vencidos têm que ser confirmados. É este mecanismo que funciona, agora se alguém recorre desta decisão, então o juiz vai verificar se isto foi suficiente para pôr em causa a acta ou se se pode sanar de imediato o vício ou então devem assumir publicamente o lapso".
O também ex-bastonário da Ordem dos Advogados referiu igualmente que os mecanismos jurídicos formais "não podem ser postos de parte neste caso, sobretudo em clima de tensão," considerando, no entanto, que este "vício não coloca em causa o número de votos".
"Por maioria de razão, quando estamos num clima de tensão temos de ser rigorosos nesses formalismos. Isso não põe em causa o número de votos, só pode pôr em causa se, por acaso, quem reclama apresentar aí as actas síntese e confrontar com os resultados definitivos", salientou.
A presença ou não dos comissários "não belisca os resultados", mas verifica-se o não cumprimento de aspectos jurídico-formais, "vício" que pode ser sanado constando este dado da acta, insistiu.
"Este aspecto jurídico formal deve ser sanado, a bem da justiça eleitoral, esses formalismos carecem de muito cuidado", rematou o jurista Inglês Pinto.
O plenário da CNE, estabelece a lei orgânica sobre a organização e funcionamento do órgão, "funciona com a maioria absoluta dos seus membros em efectividade de funções, cujas deliberações são tomadas por consenso ou, na falta deste, por maioria absoluta dos membros presentes na sessão".
A maior parte dos membros do plenário do órgão eleitoral foi indicado pelo MPLA, no poder desde 1975.
Com os resultados definitivos das eleições de 24 de Agosto, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), que obteve 51,17 por cento dos votos, elegeu 124 deputados, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), que somou 43,95 por cento, elegeu 90 deputados, quase o dobro das eleições de 2017.
O Partido de Renovação Social (PRS) conquistou dois assentos no parlamento ao somar 1,14 por cento de votos dos eleitores, mesmo número de deputados conquistaram a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) e o Partido Humanista de Angola (PHA) com 1,06 por cento e 1,02 por cento de votos respectivamente.
A coligação CASA-CE, a APN e o P-Njango não obtiveram assentos na Assembleia Nacional, que na legislatura 2022-2017 vai contar com 220 deputados.