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Política Morte de José Eduardo dos Santos

Primeiras horas de velório de JES marcadas por pouca gente

As primeiras horas de velório do corpo do ex-presidente José Eduardo dos Santos, na sua residência oficial, em Luanda, foram marcadas pela presença de poucos cidadãos anónimos junto ao local.

: Lusa
Lusa  

O corpo do ex-presidente foi preparado de manhã para os próximos dias de velório, de modo a que as pessoas possam "fazer o óbito", como é designado na tradição angolana.

Os restos mortais serão depois transportados para o mausoléu que homenageia o primeiro Presidente do país, Agostinho Neto, no dia 27 e no dia seguinte deverá ser feita uma cerimónia fúnebre, ocasião em que José Eduardo dos Santos completaria 80 anos.

A data das cerimónias deverá coincidir com o anúncio dos primeiros resultados das eleições gerais, que se realizam no dia 24.

Junto à sua residência, na zona do Miramar, foi colocado um detector de metais e estão vários funcionários estatais, entre forças de seguranças e elementos do protocolo de Estado.

Mas não foram avistados muitos cidadãos anónimos a visitar o local. Durante os "dias de óbito", a tradição angolana exige que a família tenha as portas da casa abertas a todos, com comida e bebida para quem preste homenagem ao morto.

Já na noite de Sábado, familiares e dezenas de populares juntaram-se para velar José Eduardo dos Santos, desta vez com corpo, numa cerimónia marcada não só pela presença do regime, mas também pela ausência das mediáticas filhas do ex-presidente.

O velório decorre na residência oficial do antigo chefe de Estado, uma enorme mansão localizada no Miramar, bairro nobre da cidade de Luanda, num espaço decorado para o efeito, onde o cónego Apolónio Graciano celebrou uma cerimónia fúnebre, durante a qual pediu "eterno descanso" para José Eduardo dos Santos, cujo corpo foi disputado em tribunal por duas alas da família.

Ainda antes da chegada da urna, alguns curiosos concentravam-se já junto à célebre residência na esperança de se despedirem do homem que governou Angola durante 38 anos.

Do lado de dentro, vestidos de negro, vários membros do executivo e do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) vieram prestar a última homenagem a José Eduardo dos Santos, presidente emérito do partido, e apresentar as suas condolências à viúva, Ana Paula dos Santos, e aos três filhos desta, bem como a um núcleo familiar restrito.

Do lado de fora, gritava-se "Dos Santos, amigo", à medida que os populares se alinhavam em fila para, também eles, poderem entrar na mansão que sempre lhes esteve vedada e prestar tributo ao antigo chefe de Estado.

Tiago Cristóvão, líder associativo, foi um deles.

"Entendemos que tínhamos de cá vir e acompanhar o camarada presidente, nós saímos do aeroporto para aqui", disse à Lusa, invocando a "solidariedade para com a família" para a decisão de comparecer no velório.

Mas nem toda a família recebeu hoje solidariedade.

Os cinco filhos mais velhos de José Eduardo dos Santos – entre os quais as filhas Isabel e Tchizé dos Santos - afirmaram desconhecer que o corpo do pai tinha já sido entregue à viúva e ponderam queixar-se ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

Expressaram no Domingo, através das redes sociais, a sua mágoa por não poderem despedir-se do pai na capital, onde não vão praticamente desde que o sucessor de José Eduardo dos Santos, João Lourenço, assumiu o poder, em 2017, e que, no âmbito do combate à corrupção que ergueu como bandeira do seu mandato, empreendeu uma luta que atingiu parte da família dos Santos e alguns dos seus colaboradores mais próximos.

Isabel dos Santos está a braços com a justiça angolana e Tchizé dos Santos, que seguiu o pai na carreira política e foi deputada do MPLA, diz temer pela vida se regressar a Angola. As filhas batalharam na justiça espanhola contra a entrega do corpo a Ana Paula dos Santos.

Mas também Filomeno dos Santos, filho que vive em Luanda, onde aguarda recurso de uma decisão judicial que o condenou a cinco anos de prisão, não participou no velório organizado pelo Governo, que quer realizar um funeral de Estado nos próximos dias e apoiou as pretensões da viúva contra a vontade dos filhos mais velhos.

Tiago Cristóvão manifestou o desejo que governo e família encontrem uma maneira de apaziguar a situação: "Pedimos ao camarada presidente João Lourenço para que volte a apelar para que os filhos cá estejam e venham acompanhar o seu pai até à sua última morada", declarou à Lusa.

Esperando na fila para poder "prestar homenagem ao camarada José Eduardo dos Santos, presidente de todos os angolanos", Kimuanga Bombo disse estar "de coração partido" e sublinhou que a chegada do corpo é "algo muito marcante".

"Hoje é o dia que todos nós esperávamos, é o dia que todos nós queríamos", proclamou.

Questionado sobre a ausência dos filhos mais velhos, entendeu que "é compreensível".

"São coisas que só quem vive na pele consegue sentir, acho que eles hoje ou amanhã, vendo essa moldura humana, também vão sentir e vão estar presentes", acredita Kimuanga Bombo.

E têm condições para vir, sem ser presos? "Há condições, sim senhor, o camarada João Lourenço é pai, e humanista e sabe a dor que os filhos estão a sentir, não haverá nada de errado com as pessoas que quiserem vir", confia.

A chegada dos restos mortais a Luanda coincidiu com o último acto da campanha do MPLA em Luanda, que encerrou em tom triunfante, no mesmo local onde João Lourenço iniciou a sua corrida na caça ao voto, há quase um mês.

No entanto, e apesar de a chegada do corpo a Luanda ter sido conhecida antes de João Lourenço - que se recandidata a um novo mandato nas eleições de dia 24 - discursar, este não fez, ao contrário de outras ocasiões, qualquer menção ao seu antecessor.

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