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PR em Sevilha: “Não haverá desenvolvimento no continente africano sem infra-estruturas sólidas e funcionais”

O Presidente da República e Presidente em exercício da União Africana (UA), João Lourenço, sublinhou que não “haverá desenvolvimento” em África sem “infra-estruturas sólidas e funcionais”. A consideração foi feita esta Segunda-feira durante a conferência da ONU sobre financiamento para o desenvolvimento, que está a decorrer em Sevilha (Espanha).

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CIPRA  

"É importante sublinhar que não haverá desenvolvimento no continente africano sem infra-estruturas sólidas e funcionais, pois não podemos deixar de dizer que a capacidade exígua de produção e transportação de energia eléctrica, a fraca rede de estradas e auto-estradas a interligar os nossos países, o baixo investimento em telecomunicações e tecnologias de informação e outras com magnitude equivalente com que nos debatemos, representam no seu conjunto factores que entravam o crescimento económico e o desenvolvimento, por condicionarem gravemente o comércio e a indústria, a circulação de pessoas e bens, a agricultura e a criação de empregos", referiu, ao discursar na abertura da 4.ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento.

No seu discurso, a que o VerAngola teve acesso, João Lourenço pediu para que sejam encontrados mecanismos mais ágeis e funcionais para mobilizar recursos financeiros que permitam "enfrentar os desafios recorrentes com os quais se deparam os países em desenvolvimento".

"Estamos aqui para falarmos do desenvolvimento e dos factores que concorrem para a materialização deste objectivo e, neste capítulo, esta 4.ª conferência representa uma oportunidade para darmos um impulso decisivo a iniciativas que nos levem a encontrar mecanismos mais ágeis e mais funcionais, para a mobilização de recursos financeiros que nos permitam enfrentar os desafios recorrentes com os quais se deparam os países em desenvolvimento, como os choques climáticos, as flutuações dos preços das 'commodities', a erosão da confiança no sistema multilateral e, acima de tudo, o peso insustentável da dívida soberana, que consome mais recursos do que os destinados à saúde e à educação em conjunto e limita drasticamente a nossa margem de manobra para financiar o nosso desenvolvimento", apontou.

Segundo o também presidente da UA, "esta situação constitui um obstáculo claro à realização dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 e ao cumprimento da Agenda 2063", que expressam o "compromisso comum com a construção de um mundo mais justo, mais inclusivo e mais resiliente".

Por essas razões, mencionou, a UA decidiu, na cimeira decorrida em Fevereiro, "realizar uma grande conferência subordinada ao tema 'Infra-estruturas como Factor de Desenvolvimento em África', a ter lugar em Angola em Outubro deste ano".

"Ela tem o propósito de mostrar aos nossos parceiros internacionais o mapeamento já efectuado das nossas necessidades neste domínio de investimento público ou público-privado em infra-estruturas, no sentido de os atrair e no de mobilizar recursos para a concretização desta grande ambição, que produzirá benefícios e vantagens consideráveis para todas as partes que se envolverem na sua realização", acrescentou.

João Lourenço considerou ainda que "os grandes investimentos em infra-estruturas em África requerem um modelo de financiamento mais adequado e adaptado às condições económicas dos países africanos, o que implicará uma refundação da arquitectura financeira actual, que possa ter sempre em conta as prioridades de África, muitas vezes descuradas".

Assim, continuou, "afigura-se-nos fundamental e urgente, para que se faça jus às preocupações sobre o apoio ao desenvolvimento de África, que se vão repetindo ao nível dos vários fóruns em que se aborda este tema, que nos debrucemos profundamente sobre a questão das reformas que se impõem ao sistema financeiro internacional, no qual os mais necessitados devem ter um papel activo e serem envolvidos nos processos de tomada de decisão".

"Só com estas condições asseguradas se conseguirá viabilizar os objectivos plasmados nas agendas de desenvolvimento mencionadas, de modo a evitar-se que os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável se tornem num mero enunciado de boas intenções", acrescentou.

Além de os países mais vulneráveis deverem ter "um papel activo e serem envolvidos nos processos de tomada de decisões", é preciso também, segundo João Lourenço, olhar para a dívida pública dos Estados africanos, que está a "funcionar como freio ao desenvolvimento" do continente, desviando recursos que poderiam e deveriam ser investidos em áreas chave.

A este propósito, lembrou que há uma "posição comum africana" enunciada na Declaração de Lomé da União Africana, de Maio de 2025, com propostas concretas "para enfrentar a crise da dívida", entre as quais, "a criação de mecanismos multilaterais de reestruturação mais justos e transparentes, cláusulas automáticas de suspensão do serviço da dívida em caso de choques externos e o incentivo ao uso de moeda local por forma a reduzir-se a exposição ao risco cambial".

Entre outros aspectos, o chefe de Estado também defendeu a paz e segurança mundial como essenciais para atingir os objectivos delineados na Agenda 2030 das Nações Unidas e na Agenda 2063 da União Africana.

A conferência é uma "oportunidade crucial para debatermos as fórmulas para ajudar de facto os países em via de desenvolvimento, a ultrapassarem as limitações e os condicionalismos que enfrentam para impulsionar o progresso e o desenvolvimento", considerou, referindo que quando decidiram realizar o encontro não se previa que o "mundo estivesse a viver momentos tão convulsivos como os actuais".

"Quando foi decidida a realização desta conferência, nada fazia prever que o mundo estivesse a viver momentos tão convulsivos como os actuais, carregados de incertezas e de ameaças que podem frustrar as nossas previsões a respeito do desenvolvimento em que estamos todos empenhados, por se tratar de uma questão fulcral para o presente e o futuro da Humanidade", disse.

"Perante este quadro tão preocupante, reassume um papel central, nestas nossas discussões, a questão da paz e da segurança mundial, sem as quais não conseguiremos dar nenhum passo em direcção aos nossos objectivos fundamentais, plasmados na Agenda 2030 das Nações Unidas e na Agenda 2063 da União Africana", acrescentou.

"Só numa base de conciliação de interesses e do diálogo estaremos capazes de construir um grande entendimento à escala global, que do nosso ponto de vista é um imperativo dos nossos tempos, para não nos encaminharmos para uma hecatombe em que todos sairíamos a perder", admitiu.

Segundo João Lourenço, após o fim da Guerra Fria, "quando o mundo devia dirigir toda a sua atenção ao desenvolvimento económico e social das nações", eis que se volta "a assistir à corrida armamentista de triste memória do século passado, desviando avultados recursos financeiros e científicos que deviam estar ao serviço da educação, do ensino, da formação dos jovens, do saber e da investigação científica, virada para a nobre causa do desenvolvimento e do bem-estar dos povos de todo o mundo".

"Esta é a nossa sensibilidade, como dirigentes africanos seriamente preocupados com o rumo que o mundo está a seguir e que requer de todos nós uma postura de responsabilidade na abordagem e na busca de soluções para esta assustadora crise que o nosso planeta atravessa actualmente", referiu.

Outro dos destaques do seu discurso foi o desejo de ver África transformada num continente industrializado: "A Agenda 2063 da União Africana almeja a transformação de África num continente industrializado, integrado e soberano do ponto de vista económico, objectivos que são absolutamente realizáveis, se forem alteradas todas as condições que já referi aqui e que são, de facto, o grande obstáculo a ser transposto para que alcancemos as metas a que nos propomos".

"África dispõe de abundantes recursos naturais para dar o salto que está ao seu alcance e contribuir assim para o fortalecimento da economia global e a resolução das crises de vária ordem que o mundo enfrenta", disse, acrescentando que é neste contexto que Angola "está resolutamente comprometida com a mobilização de recursos internos, com o reforço da governação fiscal e o combate à fuga de capitais, conferindo uma grande relevância à Convenção das Nações Unidas sobre Tributação Internacional, cujas negociações têm registado progressos encorajadores que devem prosseguir, pois trata-se de uma oportunidade histórica para corrigirmos os desequilíbrios do sistema fiscal global e garantirmos uma representação equitativa dos países em desenvolvimento nos processos de decisão fiscal internacional".

"Em paralelo, considero oportuno dizer que África continua a deparar-se com o facto de ser uma das regiões mais vulneráveis mas, paradoxalmente, das menos responsáveis pelas emissões de gás de efeito estufa, o que deverá levar a que se olhe para o continente com a merecida atenção, proporcionando-se-lhe um aumento significativo do financiamento climático para o processo de adaptação e mitigação, apoio à transição energética justa e incentivos para a conversão da dívida em acções ambientais concretas, pois entendemos que a resiliência climática deve andar de mãos dadas com o alívio da dívida e com a construção de modelos económicos sustentáveis", afirmou.

João Lourenço falava para uma assembleia em que estão representados mais de 190 países membros da ONU e que esta Segunda-feira adoptaram formalmente o documento "Compromisso de Sevilha", que pretende ser a base de uma nova arquitectura da cooperação internacional e do financiamento ao desenvolvimento, que tem um défice de quatro biliões anuais, segundo as Nações Unidas.

A conferência de Sevilha decorre até Quinta-feira e estão esta Segunda-feira na cidade espanhola mais de 60 líderes mundiais, entre chefes de Estado e de Governo.

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