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Defesa

Refugiado congolês continua a ser jornalista agora num centro temporário no Dundo

Jornalista profissional desde 2003, numa rádio em Kamako, República Democrática do Congo (RDCongo), Roger Beya dá agora voz ao programa que diariamente comunica com os refugiados num dos centros provisórios do Dundo, sendo ele próprio refugiado.

Unicef:

A Lusa encontrou-o a fazer programa, em francês e lingala, na rádio Boboto, uma emissora comunitária criada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) no centro de refugiados de Mussungue, arredores do Dundo.

Com música tradicional congolesa de fundo, que abrange as várias etnias representadas no centro, e entre milhares de refugiados que fugiram às milícias de Kamwina Nsapu, na região do Kasai, Roger Beya, de 40 anos, difunde mensagens das organizações não-governamentais, sobre cuidados de higiene, de saúde e com as crianças, além dos apelos lançados por outros refugiados, nomeadamente famílias desencontradas.

"O que nos fez fugir, meu irmão, foi a guerra. As milícias de Kamwina Nsapu chegaram e começaram a decapitar os funcionários do Estado [RDCongo]", recorda o jornalista, em entrevista à Lusa no intervalo da sua emissão de rádio para o centro de refugiados.

Fugiu para Angola com a mulher e os três filhos menores, chegando ao Dundo a 14 de Abril, tendo já o estatuto de refugiado, enquanto aguarda por notícias do outro lado da fronteira.

Em Kamako, Roger era jornalista da Rádio Tele-Fondation Mundele, emissora comunitária no Kasai, vizinha da província da Lunda Norte.

Continua a fazer rádio, agora para o centro de Mussungue, três horas da parte da manhã e outras três à tarde. Pelo menos quando é possível garantir o combustível para o gerador que alimenta as colunas do centro.

Além de lingala, o programa é falado também em língua nacional congolesa tshiluba, falada igualmente por algumas comunidades em Angola.

"Se tivermos condições vamos ainda transmitir noutras línguas, para que toda a comunidade fique a saber o que se está a passar e receba a informação", conta.

Na posição de entrevistado, garante que fugiu da morte e da desgraça que via nas milícias, tendo chegado a temer morrer, como tantos outros, decapitado, drama que todos naquele centro conheceram na primeira pessoa.

O coordenador da missão da UNICEF no Dundo, Teófilo Kaingona, explicou à Lusa que estas rádios comunitárias - além de Mussungue, uma outra também instalada no centro de Cacanda, noutra zona da cidade capital da Lunda Norte - servem como "veículos prioritários" para "passar mensagens chave sobre protecção, educação e higiene".

Contudo, são também utilizadas pelas várias comunidades etnolinguísticas presentes nos dois centros. "Organizam eles próprios alguns programas. Cada comunidade tem um momento próprio para fazer passar a sua mensagem", explica Teófilo Kaingona.

"Tento fazer passar uma palavra de união e de solidariedade, porque somos um só povo", desabafa Roger Beya, pouco antes de retomar a emissão e já com vários ouvintes à frente do estúdio improvisado, sem qualquer insonorização, com uma pequena mesa de mistura e um microfone a meio.

Tal como os milhares de congoleses que estão no Dundo, o futuro de Roger e da família está para já em suspenso e não passa por voltar à terra natal.

"Perdi tudo, a casa onde morava. Fui procurado para ser decapitado, se hoje voltar a Kamako, como é que vou recomeçar", questiona, desalentado.

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