A Lusa encontrou-o a fazer programa, em francês e lingala, na rádio Boboto, uma emissora comunitária criada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) no centro de refugiados de Mussungue, arredores do Dundo.
Com música tradicional congolesa de fundo, que abrange as várias etnias representadas no centro, e entre milhares de refugiados que fugiram às milícias de Kamwina Nsapu, na região do Kasai, Roger Beya, de 40 anos, difunde mensagens das organizações não-governamentais, sobre cuidados de higiene, de saúde e com as crianças, além dos apelos lançados por outros refugiados, nomeadamente famílias desencontradas.
"O que nos fez fugir, meu irmão, foi a guerra. As milícias de Kamwina Nsapu chegaram e começaram a decapitar os funcionários do Estado [RDCongo]", recorda o jornalista, em entrevista à Lusa no intervalo da sua emissão de rádio para o centro de refugiados.
Fugiu para Angola com a mulher e os três filhos menores, chegando ao Dundo a 14 de Abril, tendo já o estatuto de refugiado, enquanto aguarda por notícias do outro lado da fronteira.
Em Kamako, Roger era jornalista da Rádio Tele-Fondation Mundele, emissora comunitária no Kasai, vizinha da província da Lunda Norte.
Continua a fazer rádio, agora para o centro de Mussungue, três horas da parte da manhã e outras três à tarde. Pelo menos quando é possível garantir o combustível para o gerador que alimenta as colunas do centro.
Além de lingala, o programa é falado também em língua nacional congolesa tshiluba, falada igualmente por algumas comunidades em Angola.
"Se tivermos condições vamos ainda transmitir noutras línguas, para que toda a comunidade fique a saber o que se está a passar e receba a informação", conta.
Na posição de entrevistado, garante que fugiu da morte e da desgraça que via nas milícias, tendo chegado a temer morrer, como tantos outros, decapitado, drama que todos naquele centro conheceram na primeira pessoa.
O coordenador da missão da UNICEF no Dundo, Teófilo Kaingona, explicou à Lusa que estas rádios comunitárias - além de Mussungue, uma outra também instalada no centro de Cacanda, noutra zona da cidade capital da Lunda Norte - servem como "veículos prioritários" para "passar mensagens chave sobre protecção, educação e higiene".
Contudo, são também utilizadas pelas várias comunidades etnolinguísticas presentes nos dois centros. "Organizam eles próprios alguns programas. Cada comunidade tem um momento próprio para fazer passar a sua mensagem", explica Teófilo Kaingona.
"Tento fazer passar uma palavra de união e de solidariedade, porque somos um só povo", desabafa Roger Beya, pouco antes de retomar a emissão e já com vários ouvintes à frente do estúdio improvisado, sem qualquer insonorização, com uma pequena mesa de mistura e um microfone a meio.
Tal como os milhares de congoleses que estão no Dundo, o futuro de Roger e da família está para já em suspenso e não passa por voltar à terra natal.
"Perdi tudo, a casa onde morava. Fui procurado para ser decapitado, se hoje voltar a Kamako, como é que vou recomeçar", questiona, desalentado.