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Acordo de cooperação entre UE e países ACP estará a “funcionar” no final de 2022, prevê Georges Chikoti

O secretário-geral do grupo ACP, Georges Chikoti, prevê que o novo acordo-quadro das relações entre a União Europeia e os países de África, Caraíbas e Pacífico esteja “a funcionar” no final deste ano.

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"Rubricámos o Acordo de Pós-Cotonu em Abril de 2021 e vamos assiná-lo agora, provavelmente em Junho, na Samoa. Depois entramos no processo de ratificação pelos parlamentos nacionais. Assim que tivermos o número de ratificações mínimo começamos a implementação. Até ao final de 2022, devemos ter o acordo a funcionar", afirmou o diplomata angolano, líder da Organização dos Estados de África, Caraíbas e Pacífico (Grupo ACP), em entrevista com a Lusa.

A UE "está já a trabalhar com vários governos dos países de cada região para identificar o que podem fazer", mas também a "conversar com vários países, porque nem todos perceberam como irá funcionar o "Europa Global" ou Instrumento de Vizinhança, Desenvolvimento e Cooperação Internacional (NDICI, na sigla em inglês)", revelou ainda Georges Chikoti.

O NDICI é o músculo financeiro deste acordo-quadro. Inclui 29 mil milhões de euros destinados à cooperação com os 48 países africanos membros da OEACP, 800 milhões de euros aos países das Caraíbas e 500 milhões de euros aos estados do Pacífico. Um total na ordem de 100 mil milhões de euros será destinado a ajuda ao desenvolvimento não reembolsável pela UE aos 79 estados ACP durante os próximos 20 anos.

O novo acordo-quadro prevê uma arquitectura institucional "bastante mais complexa", com grandes alterações em relação ao anterior Acordo de Cotonu. Desde logo está assente em "três protocolos, um para África, outro para as Caraíbas e um terceiro para o Pacífico", e sua operacionalização, reconhece Chikoti, pode trazer vários desafios e até atrasos na implementação dos programas.

O secretário-geral do Grupo ACP não está, no entanto, preocupado com a eventual "marginalização" da organização que dirige, ainda que numa fase inicial, porque o acordo "está negociado, o dinheiro está lá e não vai fugir. É preciso dar tempo para termos as condições das novas instituições e dos países destinatários começarem a receber".

"É um bom acordo de cooperação. Está escrito e assinado, pode atrasar, mas o que foi acordado não vai mudar", afirmou o responsável, que elogiou o facto de este ter sido um texto "negociado de maneira profunda, com a participação de todos os estados".

"Uma das críticas que se ouve é que esta é uma ajuda colonial. Não é, porque ninguém foi forçado a entrar neste acordo. São 79 países, que, com os 27 europeus, juntos, em assembleia paritária, discutiram o conjunto dos programas e decidiram. Ninguém foi forçado a estar no acordo", reforçou Georges Chikoti.

O diplomata angolano considera ainda que "o mais importante agora é que o continente africano tenha estabilidade", até para beneficiar de vários mecanismos que se anunciam, mas que dependem crucialmente dessa "estabilidade", desde logo a Zona de Comércio Livre Continental Africana, criada no início de 2021.

"A União Africana está a avançar com a Zona de Livre Comércio, que acho muito bom, e através desta cooperação da UE-ACP podemos criar agora as infra-estruturas físicas" de que África precisa. "A cooperação com a UE traz um financiamento que eles [os governos africanos] não previam e que não têm", afirmou.

Por outro lado, sublinha Chikoti, "a Europa vai alargar a presença do Banco Europeu de Investimentos (BEI) em África, que já tem um escritório na África do Sul, e vai agora ter provavelmente um no Quénia, outro na África Ocidental. Isso vai facilitar o aparecimento de novos instrumentos financeiros de que os países africanos poderão servir-se, a taxas de juro muito boas, de 1 por cento ou 1,5 por cento".

"É necessário transformar o que África produz e também consumir o que produz através de circuitos comerciais internos, e assim criar possibilidades de emprego e de integração, com a inserção da juventude. Ao avançarmos com a transformação industrial do que se produz localmente, isso cria muitas oportunidades", sustenta o diplomata.

A Comunidade Económica dos Estados de África Ocidental (CEDAO), ilustrou Chikoti, tem "infra-estruturas relativamente estáveis". "Hoje consegue-se ir facilmente de carro desde a Costa do Marfim até Lagos. Já há uma rede digital integrada, é a região que politicamente responde hoje melhor aos desafios do desenvolvimento, mais do que a África Oriental ou a África Austral".

Este exemplo tem que ser estendido às outras regiões africanas, defende Chikoti. "A Zona de Comércio Livre vai obrigar África a acelerar e a criar as infra-estruturas físicas. Não se consegue ir de carro dos Camarões a Angola ou à República Democrática do Congo. É necessário acelerar esta integração", defendeu.

Outro instrumento que Chikoti acolheria com agrado seria a criação de uma moeda única africana para circular no novo espaço de comércio livre. "Se África for para uma só moeda, consegue harmonizar-se... Vejo, por exemplo, que nos países da África Austral há uma tendência de harmonizarem as suas moedas com o rand, [a moeda] da África do Sul. Há esta paridade...".

"É possível estabelecer-se uma moeda africana. Ou poderia estabelecer-se uma moeda africana e a adesão poderia ser livre, depois dos ajustes nacionais necessários", considerou, acrescentando que "só assim" África poderá "criar um espaço económico livre".

"Muitas das respostas residem no próprio continente e deviam depender da decisão dos próprios líderes africanos", acrescentou.

"E, se se diz que a juventude africana foge do continente, é porque não se criou até agora muitas oportunidades para os jovens poderem integrar-se em estruturas produtivas africanas. A educação científica e tecnológica é, neste aspecto, também muito importante. É isso que até agora não fizemos bem. E a maior parte de África é independente há cerca de 70 anos, não podemos culpar só quem nos colonizou", afirmou.

"É verdade que a colonização correspondeu a um período longo e que hoje ainda é um peso, sim, mas o que é que fizemos depois disso? Lutamos entre nós, não nos colocamos de acordo, não temos constituições políticas que nos permitam desenvolver-nos, estamos fechados pelo egoísmo. Há presidentes que pensam que os países são deles e que as pessoas também são deles", concluiu Georges Chikoti.

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