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Vítimas de conflitos políticos geram consensos mas 27 de Maio ainda é desafio

O coordenador da Comissão para a Reconciliação em Memória das Vítimas de Conflitos Políticos enalteceu esta Sexta-feira os consensos alcançados sobre o assunto, apesar dos desafios sobre o 27 de maio de 1977, uma tentativa de golpe de Estado.

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Francisco Queiroz, que falava no final de avaliação dos trabalhos em 2019, referiu como aspectos mais relevantes no ano passado o alcance de consenso, pela sociedade angolana, sobre as virtudes da Comissão de Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos.

Segundo o coordenador, o ambiente antes do início do trabalho da comissão e o actual "é muito diferente".

"Antes não havia um consenso sobre estas matérias e hoje o consenso é visível. É verdade que não atingimos ainda os 100 por cento, e nem sei se atingiremos, mas estamos a aproximar as visões, as sensibilidades e as verdades, porque não há apenas uma verdade", disse Francisco Queiroz.

O também ministro da Justiça e dos Direitos Humanos frisou que a comissão, além de dizer a verdade, deve ouvir todas as partes, todas as tendências e sensibilidades, bem como compreender e interpretar bem o sentido de cada uma das verdades.

"Com base nisso promover a reconciliação entre todos. Isso é que é o objecto de trabalho desta comissão, e, vendo nesta perspectiva, os ganhos são enormes", afirmou.

O governante apontou ainda como ganhos, a aprovação de um projecto de lei, que está neste momento na Assembleia Nacional, para a atribuição especial de certidões de óbito, para as vítimas que pereceram e até hoje sem registo do seu óbito.

De acordo com Francisco Queiroz, foi criado esta Sexta-feira um grupo técnico e científico, que se ocupará da realização de estudos, pesquisas, análises, para caracterizar historicamente cada episódio que gerou violência, o tipo de vítimas geradas por esses episódios de violência, definir conceitos, como os de vítima e perdão, auxiliando o trabalho da comissão.

Sobre a utilidade da comissão, cuja criação foi questionada no início, da necessidade de se falar sobre "um assunto que estava já a ficar esquecido", é hoje inquestionável, garantiu o ministro.

"O outro consenso é no sentido do propósito que esta comissão pretende alcançar, que é o do perdão e da reconciliação e dos meios que estão a ser usados para atingir esse perdão e reconciliação. O principal meio é o diálogo, é exactamente isto que temos feito ao longo das várias reuniões", adiantou.

O coordenador da comissão realçou que há também consenso quanto à letra de uma canção, que está a ser musicada neste momento, com a intervenção de cantores de grande prestígio no cancioneiro nacional.

O local onde vai ser construído o memorial, na encosta da Boavista, em Luanda, também é um dado adquirido, tendo na reunião de hoje ficado constatado que "já há termos de referência sobre a arquitectónica, que tem que obedecer a certas referências de natureza cultural, antropológica, tradicional" e "tem que reflectir o sentir do ser angolano".

Relativamente aos desafios, Francisco Queiroz admitiu que existem, "como em todos os processos", sendo o principal o que se prende com o caso 27 de maio.

"Porque o processo 27 de maio gerou dois tipos de vítimas, as resultantes da tentativa de golpe de Estado - porque o 27 de maio, na verdade, foi uma tentativa de golpe de Estado e gerou vítimas por parte das forças leais ao Governo na altura - e também gerou vítimas por parte da reacção à tentativa do golpe de Estado", destrinçou.

Segundo o coordenador da comissão, a reacção à tentativa do golpe do Estado gerou mais vítimas do que da parte governamental.

O equilíbrio entre estes dois tipos de vítimas, prosseguiu o ministro, "é o grande desafio da comissão".

"Mas o facto de termos chegado a este ponto e de termos constatado que há estes dois lados, estes dois tipos de vítimas, já é um grande avanço", considerou o governante, salientando que o grupo técnico criado hoje vai ajudar a fazer a gestão de cada um dos lados de vítimas.

A comissão foi criada por decreto presidencial, em Abril de 2019, em homenagem às vítimas dos conflitos políticos que ocorreram em Angola entre 11 de Novembro de 1975, data da independência do país, e 04 de Abril de 2002, fim do período de guerra.

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