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Deputados e Governo divididos sobre quem autoriza captação de imagens e sons

Deputados e proponentes da Lei da Identificação ou Localização Celular e Vigilância Electrónica para Fins de Prevenção e Repressão Criminal não chegaram esta Terça-feira a acordo, sobre quem deve autorizar a captação de imagens e sons para fins de prova.

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A dúvida foi suscitada pelo artigo 5.º do capítulo II da proposta legislativa, que foi já aprovada na generalidade pela Assembleia Nacional e foi Terça-feira discutida na especialidade pelos deputados.

No debate, os deputados Mihaela Weba e David Mendes, do grupo parlamentar da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), defenderam que a autorização deve ser competência de um juiz de garantia [que actua na fase de instrução], em vez do Ministério Público.

"A nossa proposta é de alterar,(...) porque se está em fase de instrução preparatória, quem está na instrução preparatória é já o Ministério Público, portanto, devia ser o juiz de garantia e assim ficava acautelada a situação dos direitos dos cidadãos", disse Mihaela Weba.

O deputado David Mendes considerou que o Ministério Público não pode interferir na vida privada das pessoas, protegida pela Constituição, sublinhando que "é preciso uma pessoa neutra, que o Ministério Público tem que fundamentar a razão da escuta e o juiz de garantia avaliar se o fundamento é bastante e os limites".

"É preciso que o juiz de garantia autorize, e não podemos abrir mão de que o Ministério Público faça aquilo que nós já queremos impedir. Ademais, se esta lei sai como pretendemos, quando aprovarmos o Código de Processo Penal [CPP], essa norma fica em contradição com aquilo que virá no CPP. Nossa opinião é que deve ser o juiz de garantia a autorizar a interferência na vida das pessoas", referiu.

Já o presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais e Jurídicos, Joaquim Reis Júnior, deputado pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), considerou a preocupação ainda maior porque o número dois do artigo 5.º refere que "na fase de inquirição, a fase em que ainda não há instrução preparatória", em que é titular o órgão de polícia, cabe a este autorizar esta escuta ou vigilância.

Em resposta, o secretário de Estado do Ministério do Interior, Bamokina Zau, considerou a questão pacífica, porque a proposta de lei não trata de escutas telefónicas, e nesse sentido "não repugna que seja competência do juiz de garantia", solicitando ao director do gabinete jurídico do Serviço de Investigação Criminal (SIC), José Alfredo, o esclarecimento da questão.

Segundo José Alfredo, a proposta de lei da identificação ou localização celular e vigilância electrónica não deve ser confundida com a escuta telefónica, que é regulada no CPP e de competência exclusiva do magistrado judicial, por serem matérias diferentes.

"Esta lei, os mecanismos que tem aqui previstos são de captação de som ou imagem em ambiente aberto, e não na comunicação. É como gravar uma conversa entre duas pessoas que estão num pátio, como gravar a imagem de duas pessoas que estão num pátio, com uma câmara de videovigilância pública, não tem nada a ver com a escuta telefónica", frisou.

O técnico do SIC realçou que não há nenhum impedimento constitucional, em que seja uma entidade diferente de um magistrado judicial, pelo que, quanto ao direito de identidade, de privacidade, de intimidade, a única reserva que a Constituição faz é que sejam matérias reguladas por lei, o que esta proposta apresenta.

"O mesmo em relação à inviolabilidade do domicílio. Portanto, não há uma obrigatoriedade de existir uma autorização de um magistrado judicial", ao contrário do que acontece com as escutas ou intervenção nas comunicações telefónicas ou telemáticas, esclareceu.

A proposta de lei, adiantou o técnico, prevê apenas a investigação, instrução, aquisição de provas através de meios electrónicos, desde que não abranja as comunicações.

As explicações não convenceram David Mendes, insistindo que é invasão de privacidade a gravação, para fins de prova, da conversa entre duas pessoas.

"A invasão à vida privada é carente de autorização judicial. Além do mais fez uma comparação pouco acertada, quando diz que a invasão de uma residência não carece da autorização de um juiz. Carece, até agora foi errado (...) isso tem de acabar", defendeu o deputado, acrescentando que é preciso retirar o poder ao órgão que instruí "de invadir a vida das pessoas".

Face às divergências, o presidente da sessão propôs a suspensão da aprovação do capítulo II da proposta de lei, para melhor debate da questão.

"Há aqui tendências completamente diferentes (...), temos que amadurecer, encontrar uma formulação que sirva o interesse da instrução processual ou da investigação e também sirva o interesse da defesa dos direitos dos cidadãos, é isso que temos que encontrar, um meio termo, para que a lei cumpra os seus objectivos", frisou.

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