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Tese de antropólogo português traça caminhos para valorizar e certificar o semba

Caminhos para a inclusão, valorização e certificação do género musical angolano semba estão traçados na tese de doutoramento de um antropólogo português, que assinala desafios para a preservação e sustentabilidade deste activo cultural e dos seus fazedores.

: Ampe Rogério/Lusa
Ampe Rogério/Lusa  

"Semba enquanto Património Imaterial: Políticas, Imagens e Sonoridades da Cultura em Angola" foi a tese de doutoramento do antropólogo português André Castro Soares, onde este considera que o semba – como género de música e dança elevado à património histórico-cultural imaterial nacional em 2023 – é uma "ferramenta de diálogo e transformação social".

O autor destacou, esta Terça-feira, em entrevista à Lusa, a importância e o potencial do semba para a sustentabilidade e a afirmação identitária dos angolanos, dentro e fora do país, referindo que a sua análise antropológica, elaborada durante dois anos, abre caminhos para maior valorização.

"A tese indica o caminho. Se as comunidades preservarem o seu património, trabalharem e criarem repertórios, novas narrativas ou reformular as antigas narrativas, conseguem sobreviver", referiu.

"Mas, depois é preciso serem acompanhadas por políticas do Estado, coisa que muitas vezes não é feita", realçou, considerando também que pode ajudar as comunidades e grupos a encontrarem o seu trabalho e, por via disso, a sustentabilidade dos projectos musicais.

Com a valorização do semba, através do seu reconhecimento como património, os seus fazedores poderão "desenvolver trabalhos fonográficos (discos e músicas) que depois podem alimentar a indústria mediática, rádio e televisão, o turismo e outras", salientou o autor.

André Castro Soares, 45 anos, natural de Vila Nova de Gaia, que trabalhou durante oito anos em Luanda na Televisão Pública de Angola (TPA), por via da Semba Comunicação (então gestora de conteúdos do Canal 2 da TPA), referiu que a pesquisa nasceu da expressão musical do Semba nos "musseques" luandenses.

Do contacto com os fazedores do Semba, desde cantores, como os integrantes da Banda Maravilha, instrumentistas, particularmente Jorge Mulumba, membro do grupo folclórico "Nguami Maka" e professor da "dizanka" – idiofone de fricção tradicional construído em madeira ou bambu –, a grupos e escolas de Semba nos bairros, André foi ganhando bases para a tese.

"Aí começamos a fazer um trabalho da importância do património cultural imaterial visando alimentar as comunidades de forma sustentável", recorda, destacando ainda trabalhos desenvolvidos com a directora do Instituto Nacional do Património Cultural (INPC) de Angola.

A tese indica que estas pessoas "com este activo patrimonial que é o semba, com os conhecimentos que adquirem de forma 'aural' e não oral, porque envolve também o corpo e a aprendizagem ecológica, conseguem passar a ser elas a preservar o seu património e fazerem dinheiro com isso", realçou.

André Castro Soares sinalizou também que a tese destacou os desafios enfrentados pelas comunidades e grupos expoentes do género musical, como a precariedade e a falta de conhecimento, alertando para a importância de uma abordagem "inclusiva e sustentável para a promoção e preservação do semba".

"É preciso envolver a academia angolana nesses processos para o auxílio às comunidades", defendeu, salientando, no entanto, a ausência de espaços próprios para grupos culturais (dança, música, carnaval) desenvolverem e aprimorarem suas actividades.

Traz igualmente os conceitos de "fricções" e "polinizações" no universo do semba em Angola, considerando que estes dois eixos, o primeiro que emana da sonoridade da "dikanza" e o segundo das reflexões sociais e das políticas estatais, são "catalisadores dos progressos observados no semba".

"O INPC vai sendo polinizado por estes grupos e estes vão sendo polinizados pelas políticas do Estado, entre os prémios, concursos, as apresentações e outras e, basicamente, a partir da música faço uma leitura o que é a sociedade angolana, que funciona muito com polinizações e fricções", concluiu o autor.

O Governo desenvolve acções para a inventariação do semba a património imaterial na lista da UNESCO.

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