“A repressão aumentou, temos companheiros presos até agora, temos a situação da Neth Nahara ['tiktoker'] e sabemos que todas essas acções que o Governo leva a cabo é mesmo para silenciar vozes e tentativa de alguma manifestação de rua”, disse a activista Laurinda Gouveia.
Em declarações à Lusa, Laurinda Gouveia, uma das protagonistas do caso que ficou conhecido como “15+2”, em 2016, referiu que muitos activistas em Angola abraçaram outras formas de luta a nível das comunidades, observando, no entanto, que algumas leis, como a que criminaliza o vandalismo, alimentam o medo entre os cidadãos.
“Tudo isso acaba por, de alguma forma, trazer algum medo, alguma falta de confiança das pessoas poderem se manifestar, apesar de que a fome poderia ser um dos factores que nos poderia fazer levantar”, disse.
“O custo de vida vai aumentando cada dia, as pessoas têm de fazer 'sócia' [acto que consiste em juntar dinheiro entre várias pessoas para a compra de determinado bem] de tudo para sobreviver, mas ainda assim nós, enquanto actores sociais, continuamos no silêncio”, lamentou.
Para Luaty Beirão, activista do mesmo processo em que esteve arrolada Laurinda Gouveia, a repressão do Estado está entre os factores que travam as pretensões de manifestações de rua por parte dos cidadãos, que, no seu entender, se deixam morrer asfixiados.
“Por esta altura, já me cansei de tentar entender ou teorizar essa apatia de quem se deixa morrer asfixiado, sem esboçar um gesto que sinalize a sua vontade de sobreviver”, disse à Lusa.
Considerou, por outro lado, existir uma conjugação de factores, que concorrem para a actual “apatia dos cidadãos”, como, frisou, o “binómio repressão do Estado mais as igrejas”.
“Porém, como seres humanos, todos têm um limiar a partir do qual se produz uma reacção. A marca onde eu achava que esse limiar se situava já foi ultrapassada há muito tempo, por isso, não tenho mais teorias”, atirou.
Laurinda salientou, por outro lado, ter a percepção de que a luta realizada anteriormente por dezenas de activistas, sobretudo na era do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, ter hoje caído em “banho-maria” devido ao actual “conformismo” dos cidadãos.
“Porque as pessoas deveriam estar hoje mais despertas”, notou, acrescentando que muitos jovens infiltram-se no seio dos activistas, alegadamente por parte do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).
“Muitos jovens infiltraram-se no nosso seio, fazendo-se se passar como activistas, mas agora são pessoas que estão a ser instrumentalizadas directamente por pessoas do MPLA para desacreditar totalmente aquilo que é a luta que começámos”, apontou.
Insistiu também que a prisão dos activistas Adolfo Campos, Gilson da Silva Moreira “Tanaice Neutro”, Hermenegildo André “Gildo das Ruas” de Abraão dos Santos, desde Setembro de 2023, e da 'tiktoker' Ana da Silva Miguel “Neth Nahara”, presa há quase um ano por injúrias, nas redes sociais, ao Presidente João Lourenço, são reflexos de uma “ditadura bem mais fortificada” da actual governação.
“É mesmo medo, mas é um medo quase que colectivo, porque sei que se sair à rua para uma manifestação deve aparecer um número ínfimo de pessoas, porque as pessoas estão a passar por esse senso de colectivização, de medo que está a ser implementado pelo partido no poder”, concluiu Laurinda Gouveia.