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Batida e o concerto mais político do Festival Músicas do Mundo

O projecto Batida protagonizou o concerto mais político do Festival Músicas do Mundo, que terminou no Domingo e que tem como marca trazer artistas-activistas às cidades portuguesas de Sines e Porto Covo.

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Batida – ou Pedro Coquenão – e Ikonoklasta – ou Luaty Beirão – subiram ao palco do Castelo de Sines com Ikoqwe, um espectáculo dirigido por Pedro Coquenão, que contou ainda com o bailarino André Cabral, entre outros.

Dois seres de outro planeta vieram “responder a uma emergência na Terra” e deixaram uma série de mensagens aos terráqueos.

Muitos líderes políticos mundiais foram chamados à pedra, com recurso a 'samples', por exemplo da eurodeputada portuguesa Marisa Matias, dirigindo-se ao Presidente francês, Emmanuel Mácron, sobre o ataque contra a Síria, exigindo-lhe: “Pare de vender armas.”

Ou outro ainda, do ex-primeiro-ministro português José Sócrates a dizer que é “muito vaidoso, como todos os políticos” e que “a vaidade é uma das características humanas” – que foi acompanhado por assobios e apupos do público.

“Não é só os peixinhos que morrem pela boca, os políticos morrem pela boca”, cantou Ikonoklasta, que não deixou de acrescentar que também “os artistas morrem pela boca”, porque se queixam de “falta apoio”, mas depois vendem-se por 'playlists' e rapidamente deixam de lado o activismo. “Pau, pau, é a morte do artista”, sentenciou.

Na “utopia” dos dois seres que falaram aos terráqueos, “evoluir é aceitar reconhecer os erros do passado”, sabendo que “dois passos em frente obrigam a um para trás”.

Vieram à Terra “sublinhar o óbvio”, que “ninguém vale menos do que o outro por causa do sítio de onde vem”.

No planeta Ikoqwe, “quem era diferente agora é irmão”. E ficou o aviso: “Quem se acha superior não tem lugar aqui, aqui é tudo igual, aquele que estudou menos do que nós tem sempre uma lição para nos ensinar.”

“Aprende a aprender a amar”, apelou Ikonoklasta, falando de refugiados – que “não são terroristas” – e de migrantes – importantes para contrariar o envelhecimento europeu.

“Todos somos feitos de cruzamento”, reclamaram. E os terráqueos responderam com palmas. “Terráqueos, vocês são bonitos, vocês sabem ser bonitos”, constataram.

A seguir, mais um 'sample' sobre o mais recente inquérito Atitudes Sociais dos Portugueses, com dados do European Social Survey que mostram um Portugal com um elevado índice de racismo. “Portugal é um país racista? Claro que é”, assumiram, frisando que “o combate ao racismo passa por o reconhecer primeiro”.

À ideia feita de que não nos devemos meter em seara alheia contrapropuseram que “o problema é sempre de todos, porque ninguém vive sozinho”.

E foram muitos os problemas que trouxeram para o palco: o consumo de antidepressivos e as doenças mentais (“Quem é que quer ser normal? O que é normal?”), com direito a versão portuguesa da música “Psycho Killer”, dos Talking Heads; a protecção do ambiente (“Está na hora de aprender a venerar os oceanos”); a falta de água; e o impacto que sempre prejudica mais as mulheres.

Assumindo que “talvez” sejam radicais, sentenciaram que “faltam soluções que garantam igualdade” e que querem uma democracia “onde qualquer pensador diferente” não seja “religiosamente afastado”.

Na assistência, Gonçalo Guedes, produtor de espectáculos, elogiou os simbolismos e os “textos extremamente bem escritos”, a direcção artística e toda a 'mise en scène'.

“É bom haver projectos destes. Fazem falta neste momento, em que o mundo está de cabeça perdida, cada vez mais bipolarizado, cada vez mais radicalizado, cada vez com mais loucos, cada vez com mais racismo, maiores divisões, críticas às migrações e aos refugiados. Fazem falta projectos destes, mais politizados, com uma mensagem”, observou.

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