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Quebra na maior fronteira não trava interesse no negócio com o país vizinho

O contrabando de combustível para a Namíbia é a maior preocupação das autoridades angolanas na fronteira de Santa Clara, a mais movimentada do país, no sul, apesar de a crise ter afundado a circulação entre os dois países.

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"O movimento diminuiu consideravelmente, com consequências em pessoas e bens", começa por explicar, à agência Lusa, em plena linha de fronteira de Santa Clara, o superintendente-chefe Lourenço Sacambela, comandante da Polícia Fiscal da província do Cunene.

A mais de 1300 quilómetros de Luanda, no extremo sul, a fronteira terrestre mais movimentada do país sofre desde finais de 2014 com a crise económica e cambial, desde logo pela falta de divisas, necessárias para qualquer deslocação ao lado namibiano. Lá, os angolanos encontram de tudo, do comércio aos serviços de saúde, passando pela educação e alimentos, num movimento que envolve ainda outros produtos e serviços.

No sentido contrário, a maior preocupação da polícia é o contrabando de combustível para a Namíbia, contando para isso o preço substancialmente mais baixo do lado de Angola. Somam-se os produtos da cesta básica, mais baratos em Angola, mas cuja exportação é proibida pela legislação.

"O combustível é mais barato cá e devido ao câmbio, o angolano ganha, o dobro ou o triplo, porque tem a divisa", explica o oficial. O resultado, explica Lourenço Sacambela, são cerca de 30 infracções por mês, desde transgressões fiscais ou cambiais detectadas na fronteira.

Ainda assim, um cenário muito diferente da realidade até 2014: "Antes, nem o triplo. Num dia tínhamos mais de 50 ou 60 infracções", conta o comandante.

A caminho da Namíbia, Fátima Mbula, angolana, prepara-se para carimbar, mais uma vez, o passe de travessia na fronteira de Santa Clara. Na bolsa, conta à Lusa, leva macarrão, massa e óleo, o mínimo permitido por lei, para vender do outro lado da fronteira.

"Consigo trazer rands [moeda sul-africana] e rende mais", explica. Cada pacote de massa que compra em Santa Clara, por exemplo, vende do outro lado a cinco rands, pelo que, na prática, após a troca da moeda, pode fazer o dobro do dinheiro do que investiu.

No sentido contrário, Júlia Martinho, 50 anos, funcionaria pública angolana, segue para fazer compras na Namíbia. "Vou lá uma vez ou outra, devido à diferença de preços", explica. O problema, confessa, é mesmo a falta de divisas (rands) para levar, já do outro lado da fronteira o kwanza angolano não serve.

"Compro quase tudo. Até o sal, aqui na Namíbia é quase tudo mais barato, o problema é só a troca [do kwanza], o rand ou o dólar está muito alto. Mas sempre temos uns troquinhos", aponta.

A falta de divisas, ou neste caso pelo menos rands sul-africanos para fazer negócio na Namíbia, acabou com outro problema naquela fronteira: o contrabando de viaturas usadas a partir da Namíbia.

É que em Angola, a importação de viaturas usadas com mais de três anos é proibida, mas ainda representava um negócio para muitos. "Hoje praticamente não se regista. Praticamente desapareceu esse contrabando", afirma o comandante da Polícia Fiscal no Cunene.

Admite, contudo, que muitos angolanos optam por "caminhos fiotes", ou atalhos ilegais, para, numa fronteira com quase 500 quilómetros, aproveitar a oportunidade e realizar o contrabando, nomeadamente, além de bidons de combustível, de alimentos da cesta básica, muito procurados na Namíbia.

"Não podemos deixar passar porque as normas angolanas dizem que a cesta básica não pode ser exportada", aponta o superintendente-chefe Lourenço Sacambela, reconhecendo que em grande parte dos casos detectados tudo não passa de "falta de cultura jurídica". "Por isso é que tentamos sempre, em primeiro lugar, sensibilizar os nossos cidadãos", conta.

Apesar da apertada vigilância na fronteira, ainda passam por Santa Clara medicamentos, alguns contrafeitos que a polícia não deixa passar, mas estes em "pequenas quantidades", vindos do outro lado, e alguns cereais seguem o caminho contrário, para serem vendidos na Namíbia, carregados à cabeça pelas angolanas.

Um cenário que no entanto, por estes dias, contrasta com a "enorme mercadoria" que passava por Santa Clara, sobretudo vinda da Namíbia. Chegavam a ser 300 camiões diários. "Estamos aqui há uma hora e nenhum camião entrou", reconhece o comandante da Polícia Fiscal.

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