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Doentes angolanos em Portugal sofrem com fim de apoios mas não se arrependem de ficar

Os doentes angolanos em Portugal que se recusaram a regressar ao país viram a situação agravar-se no último ano e alguns companheiros morrer, mas não se arrependem da decisão, pois acreditam que em Angola já tinham morrido.

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"Em Angola o básico não existe. Para doentes como nós, muitos transplantados, à mínima infecção podemos morrer. Aqui, apesar das muitas dificuldades, ainda temos assistência, consultas e medicamentos. Não chega, mas dá para sobreviver", disse à Lusa o secretário-geral da Associação dos Doentes Angolanos em Portugal (ADAP).

Vitorino Leonardo, um doente transplantado em Portugal, vê com acrescida preocupação as "cada vez maiores" dificuldades por que passam os seus conterrâneos, desde que em Janeiro do ano passado o Governo anunciou o encerramento da junta de saúde em Portugal.

A decisão significou o regresso a Angola de alguns doentes, sem meios para continuarem em Portugal, uma vez que os apoios financeiros e de alojamento que até então recebiam acabaram.

Mais de uma centena optou por ficar por sua conta e risco. Tiveram de deixar as pensões onde viviam, cuja renda estava a cargo do executivo, e vivem agora junto de familiares ou em espaços que alugam, com alguma ajuda das famílias que ficaram em Angola.

A maioria, disse Vitorino Leonardo, tem de ir buscar alimentos às instituições, mas o pior são as carências a nível dos medicamentos e suplementos, para os quais o dinheiro não chega.

"Um doente transplantado, por exemplo, tem muitas doenças. Eu tenho um rim transplantado, mas tenho diabetes, hipertensão. Como eu, muitos companheiros não conseguem pagar as vitaminas e os suplementos de que precisamos e que não são comparticipados. E mesmo os medicamentos comparticipados, o dinheiro raras vezes chega para pagar a parte do doente", disse.

E lamentou: "O primeiro medicamento é o alimento e esse é aquele que muitos destes doentes não conseguem tomar em condições".

Segundo Vitorino Leonardo, só uma percentagem muito pequena de doentes é que consegue manter um emprego para pagar as despesas.

"Ainda ontem morreu uma senhora. Tinha uma saúde muito frágil, trabalhava nas limpezas, mas apanhou covid e, como não tinha defesas, não resistiu e morreu. É a toda a hora estas notícias", disse.

Manter um trabalho com estas doenças é missão quase impossível: "Estes doentes faltam muito para as consultas, os tratamentos, vão abaixo facilmente e ninguém quer um trabalhador assim".

Aos danos físicos somam-se os psicológicos, pois a dependência, a falta de respostas e garantias leva a que estes doentes não consigam "seguir em frente".

As preocupações de Vitorino Leandro também se prendem com a dúzia de doentes que, a custas do Estado, estão em Portugal, na pensão onde já lá viveram dezenas.

"Eles têm alojamento garantido e um subsídio, mas estão em péssimas condições e ainda por cima com os subsídios atrasados há muitos meses", referiu.

Na hora de descrever este ano que passou desde que acabou a junta de saúde em Portugal, Vitorino Leandro disse que ninguém se arrepende de ter ficado. "Angola é uma sentença de morte para estes doentes. Aqui, pelo menos, estamos vivos", afirmou.

A 30 de Janeiro do ano passado, o Governo anunciou o encerramento da junta de saúde em Portugal, a partir de Fevereiro desse ano, após uma auditoria que identificou vários abusos no uso deste mecanismo.

Na altura, o executivo disse que se encontravam em junta médica em Portugal 385 pessoas (245 pacientes e 108 acompanhantes).

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