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Fuba, raízes e fruta mal chegam para matar a fome na província da Huíla

Fuba, raízes e frutos silvestres: em vastas áreas da província da Huíla, onde não chove desde Fevereiro, são estes os alimentos que ainda ajudam a matar a fome da população atingida pela seca.

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A dieta é escassa, pouco nutritiva e muitas vezes não chega para fazer uma refeição por dia. Sem chuva, não se cultiva e sem agricultura não há alimentos.

O município dos Gambos, 150 quilómetros a sudeste da capital da Huíla, Lubango, é um dos mais atingidos. A estrada é monótona, pontuada por cactos, arbustos e árvores secas, a vegetação possível nesta paisagem árida e pedregosa, cruzada aqui e ali por pastores que encaminham os seus bois e cabras por rotas de transumância ou até ao bebedouro mais próximo.

Um ou outro povoamento disperso interrompem de vez em quando a quase ausência humana.

Metade dos seus 90 mil habitantes estão a ser afectados pela seca, segundo o administrador dos Gambos, Elias Sova.

“A seca é um caso sério em toda a região e em particular neste município”, diz aquele responsável à delegação de deputados da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) que se deslocou à região no âmbito das VIII Jornadas Parlamentares do principal partido da oposição.

“O município, pela sua localização geográfica fortemente influenciada pelo deserto do Kalahari, tem um clima semi-árido e naturalmente chove pouco. E este ano foi pior”, resume o administrador.

De um total de mais de 92.464 habitantes, mais de 42 mil (7622 famílias) estão a ser afectadas pela seca. Elias Sova fala ainda em 116 mil cabeças de gado ameaçadas pela falta de água e diz que o município está a acompanhar os mais vulneráveis, como idosos, órfãos e deficientes físicos, “na medida do possível”, sublinhando que “todos os apoios são necessários”.

No entanto, acrescenta: “mais do que comida, o que interessa é que nos dêem sementes e enxadas para caminharmos sozinhos”.

Paula, Fátima, Lúcia são algumas das protagonistas do drama que se desenrola no sul do país.

São elas as heroínas que fazem a difícil gestão de quem pouco ou nada tem para gerir. São elas que transportam a água, são elas que aparecem para receber os donativos, são elas que lavam roupa nos fios de água que ainda correm, são elas que carregam os filhos, que os alimentam, que os cuidam. São elas também que aparecem em maior número na sede local da UNITA, exibindo vestes tradicionais, coloridos colares de missangas e penteados intrincados, para ouvir e festejar a vinda dos deputados. E, claro, para receber parte do milho que estes transportam.

E os homens, onde andam? Há quem diga que foram caçar, mas muitas estão apenas sozinhas devido à morte ou simples abandono dos pais dos seus filhos.

Paula mora na zona urbana dos Gambos com oito dos seus 15 filhos. É alta, magra e tem os dentes da frente modificados e abertos em “v”, como outras mulheres que assinalam desta forma a pertença identitária aos povos locais.

Sem chuva, não consegue cultivar e lenhar é, por agora, o seu modo de vida.

“Aqui estamos com muita fome, aparecer comida é difícil. Tenho de lenhar para comer. Quando compram, dão 100 kwanza e compro um quilo de fuba”, desabafa a mulher, de 56 anos.

Quando consegue fuba, cozinha a farinha com água e sal. É esta, na maioria das vezes, a refeição diária de Paula e dos seus oito filhos.

Paula tem um tanque em casa e consegue abastecer-se periodicamente de água, mas alguns quilómetros à frente, em Tchiepepe, este é um bem mais escasso.

Nesta zona rural com casas isoladas, habitam cerca de duas mil pessoas apoiadas pela missão católica liderada pelo padre Pio Wakussanga, que há vários anos pugna pela melhoria do acesso dos camponeses à água.

Enquanto os donativos da UNITA são descarregados – entre sacas de milho e fuba, vêm também cadeiras para substituir as pedras que servem actualmente de assento para as crianças na igreja – um catequista e algumas mulheres juntam-se para falar com os deputados sobre as dificuldades que vivem, enquanto cães famintos farejam à volta na expectativa de serem alimentados.

Maria de Fátima Tuendi é professora primária, viúva e mãe de seis filhos.

Conta que com o seu salário ainda consegue comprar alguma comida para si e para os filhos, mas o mesmo não acontece com algumas das vizinhas que a acompanham. Mal falam português, mas fome é uma palavra que todas conhecem.

Habitualmente cultivam milho e massango, mas este ano “a seca está demais”, lamenta Lúcia Amélia Chipito, de 49 anos, com nove filhos a cargo.

Restam-lhes alimentos como o nonhandi, um fruto local da família do dióspiro que também é usado como moeda de troca.

Mas a época deste acabou, e enquanto as chuvas não regressam, nas aldeias escava-se o solo em busca de raízes comestíveis que depois são secas ao sol e moídas para obter alguma farinha.

Com a seca a agravar-se, muitos homens emigraram, abandonando as famílias. São as crianças que reforçam a ajuda às mães em rotinas diárias como o transporte de água, enchendo baldes e depósitos que terão de transportar a vários quilómetros de distância até casa.

Quando podem, usam a água do fontanário, bombada através de um gerador pertencente a fazendeiros locais, mas quando este é desligado, a alternativa é abastecerem-se nas charcas insalubres onde o gado bebe e cuja água irão usar nas lavagens, para cozinhar e até para beber.

Em Outubro, dizem, regressa a época da chuva e com ela a esperança.

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