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Espanha dança cada vez mais ao som da kizomba

No país do Flamenco e do Paso Doble, os sons lentos, sensuais e o "abraço" da kizomba estão a conquistar cada vez mais espanhóis, que até vão a Lisboa para aprender com os mestres angolanos, cabo-verdianos e portugueses.

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Yanis (nome artístico de Carlos Soares Francisco) é angolano - "do município da Maianga, em Luanda" - e ensina kizomba em Espanha há dez anos, desde que tinha 18. "Cheguei a Espanha com uma companhia de dança francesa. Fizemos vários espectáculos, gostei e acabei por ficar". Ficou para ensinar kizomba, uma dança que "engancha" os espanhóis, já habituados a danças latinas como a salsa, o merengue ou a bachata. "Os meus alunos que entram para a Kizomba, pelo menos em Valência, já dançavam Salsa, mas uma vez que experimentam já ninguém quer sair, já não existe mais nada", conta Yanis à Lusa.

A kizomba é muito diferente das danças latinas a que os espanhóis estavam habituados e radicalmente diferente da sua mais emblemática dança, a que marca a herança cultural espanhola, o flamenco. Originária de Angola, a kizomba só se dança em pares, homem e mulher muito juntos, abraçados, com as ancas dela e a pélvis dele a marcar os ritmos da música. O homem guia o par com uma mão ao fundo das suas costas e é assim que dá mais ou menos espaço. Os movimentos são serpenteantes e os pés dos dançarinos caminham a música, como no tango.

Yanis diz que era mesmo disto que os espanhóis estavam a precisar: abraço e calor. "O que mais impressiona e deixa marca nos espanhóis quando conhecem a kizomba é a ligação com a outra pessoa, receber o calor do outro, receber esse abraço, essa liberdade de dançar sem ter mal. A música, o sentimento e a energia que se desprende da kizomba também envolve as pessoas", conta Yanis, num português já arranhado aqui e ali pelo castelhano que todos os dias fala em Valência. "Estás abraçado a uma pessoa que não conheces e, de repente, ‘conectas' com essa pessoa, é algo incrível. É isso que engancha os espanhóis", conclui.

Belén Casado é professora de kizomba na Flow, uma das escolas de dança em Madrid que há mais tempo se dedica a esta dança africana. Concorda com Yanis, mas realça que a música é o "gancho inicial". "O gancho inicial da kizomba é a música. Mas acredito que qualquer dança é terapêutica. Estamos numa sociedade em que num encontro com amigos, metade deles estão no Whattsapp. Só que as pessoas procuram um contacto, uma mão que te agarre, um abraço, mais do que Facebook. Por isso digo que a primeira coisa que atrai os alunos de kizomba é a música e depois é rasgar essas estruturas de espaço e partilhar", diz Belén.

Belén começou a ter contacto com a Kizomba em 2009, através do professor de dança panamenho Albir Rojas. "O Albir começou a formar-se na kizomba indo a Lisboa aprender com mestres como os cabo-verdianos Kwenda Lima e Hélio Santos. É através dele que a Kizomba chega a Madrid e depois a toda a Espanha", conta.

Belén e David (também na escola Flow) e outros três espanhóis começaram a aprender com Albir, mas seguiram o caminho habitual naquele tempo de exploração da kizomba em Espanha: ir a Lisboa para ter aulas com os mestres angolanos Petchu e Vanessa. Actualmente, não há dia da semana em Madrid ou em Valência que não se consiga dançar kizomba, pelo menos num clube ou discoteca. No entanto, no início era tudo mais difícil.

"Ao princípio deparávamo-nos com uma dificuldade curiosa: os alunos ficavam encantados com a kizomba. Foi um ‘boom'! Adoravam dançar kizomba, mas não tínhamos locais em Madrid onde se pudesse dançar", conta Belén, explicando que os "salseros" não queriam abdicar do seu "espaço".

Yanis teve uma experiência semelhante, em Valência. "Há cinco anos pedia para porem kizomba [num clube ou discoteca] e ninguém sabia o que era. Por isso foi complicado introduzir a kizomba, mas desde há três anos ficou mais fácil", conta o angolano. Não só a música está cada vez mais presente na noite das cidades espanholas, como há cada vez mais alunos a cursarem kizomba nas escolas.

"Aqui na escola há cada vez mais alunos e as escolas que dão aulas de danças latinas, todas têm pelo menos um professor a dar kizomba", adianta Belén. Esta tendência vem preencher uma necessidade, acrescenta a professora de dança, entre risos, porque "a sociedade espanhola está com muita falta de carinho e de contacto de pele".

 

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