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Pedro Pinotes: “Podemos trocar de clube, mas a nação que representamos, essa tem de estar sempre no coração”

Pedro Miguel Alves Pinotes é um atleta de natação luso-angolano, natural de Luanda. Aos 12 anos, começou a praticar natação federada, e aos 18 já era atleta de alta competição. Em Setembro de 2015, nos Jogos Africanos, conquistou a medalha de prata, o resultado mais marcante da sua carreira, e fixou, nos 400 metros estilos, a melhor marca de toda a natação angolana. Pedro Pinotes, que já foi medalhado várias vezes, esteve presente nos Jogos Olímpicos de Londres em 2012, e este ano, leva novamente as cores do nosso país ao Rio2016.

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Pedro fale-me um pouco de si. Onde nasceu e cresceu, que idade tem, os seus estudos...

Nasci em Viana, perto de Luanda. Cresci entre Luanda, Maputo e no sul de Portugal... Até aos 12 anos nunca vivi mais do que três anos na mesma cidade. Tenho neste momento 26 anos, sou já mestre em Engenharia Civil pelo Instituto Superior Técnico em Lisboa, e conto começar a exercer muito brevemente a profissão, logo a seguir aos Jogos do Rio 2016.

Numa modalidade tão competitiva e que exige muito treino, normalmente, os competidores começam muito cedo a praticar. Foi assim no seu caso? Como surgiu o gosto pela natação?

Ao contrário da maioria dos nadadores, não comecei cedo e não foi por indicação médica. Aliás, sempre tive problemas respiratórios, e um dos meus primeiros médicos alertou logo a minha mãe: "Se quiser continuar a ter problemas, ponha-o numa piscina". Anos mais tarde, aos 11 anos, o gosto por estar dentro de água, e por nadar, fizeram com que fosse a natação a modalidade que escolheria continuar a praticar. Logo aos 12 anos comecei a competir, e quase aos 18 anos comecei a ser, aquilo que eu considero, um atleta de alta competição.

Exerce outra actividade ou a natação é a sua única profissão?

Após terminar o mestrado integrado, no final de 2014, resolvi optar por me dedicar a 100 por cento à natação, até aos Jogos Olímpicos deste Verão. Acompanho a profissão, e tudo está muito bem encaminhado para iniciar actividade, logo depois de regressar do Rio de Janeiro.

Quais são os estilos que pratica na natação?

A minha melhor prova é de estilos, ou seja, acabo por treinar e ser minimamente competitivo em todos os estilos. Mas claramente costas é o meu pior estilo, e o melhor, varia consoante a fase da época.

Fale-me um pouco da sua rotina de treinos. Como é a semana do Pedro?

A semana começa ao Domingo à noite, pois a rigidez e intensidade da semana, propriamente dita, fazem com que tenha que me preparar muito bem, ainda durante o Domingo. Treino na água de manhã das 06h30 às 08h30, e de tarde das 15h00 às 17h30. De seguida, vou para o ginásio, até por volta das 19h00. Geralmente, só folgo à Quinta-feira de manhã. Ao Sábado repete-se a dose da manhã. Grande parte dos fins-de-semana estão ocupados com competições, e as férias resumem-se a cerca de 15 ou 20 dias por ano, devido a ter que conciliar o calendário português, angolano e internacional.

Até agora, qual foi o seu melhor resultado desportivo? Foi a conquista mais marcante na sua carreira?

Foi sem dúvida a medalha de prata nos Jogos Africanos, em Setembro de 2015. Era um objectivo que tinha há muito estabelecido, e foi o culminar de uma época em que conquistei inúmeros títulos nacionais, individuais e colectivos, e o apuramento olímpico. Como se costuma dizer, a cereja no topo do bolo! (risos)

Qual o seu próximo objectivo desportivo?

O próximo objectivo é alcançar um novo recorde nacional absoluto, na prova que vou nadar no Rio 2016, os 400 metros estilos. A marca é a melhor de toda a natação angolana, e foi fixada precisamente nos Jogos Africanos que referi.

O que representa para si a natação?

A natação representa grande parte da minha vida. Dos 26 anos que levo, estimo que em quase metade deles nadei, seja a treinar ou a competir. É quase como um hábito de comer ou dormir. Creio que no futuro também continuará a ser, mas sobretudo por lazer.

Como avalia o seu percurso como atleta de natação até aqui?

A minha carreira, enquanto nadador, foi sempre construída com base no trabalho e na dedicação. Sou muito objectivo nas minhas metas, e isso faz com que o meu percurso tenha, naturalmente, uma lógica associada. Por vezes as coisas não correram tão bem como queria, mas sempre lutei para que na prova seguinte, a minha prestação fosse a desejada. Sou um atleta esforçado, penso que isso se reflecte no resto da minha vida.

Que dificuldades sente na sua actividade desportiva?

Em termos gerais, é muito complicado gerir anualmente a época de um atleta, que treina fora do seu país. Como referi anteriormente, são três calendários, que ao longo destes nove anos de nadador, de alto rendimento, tento conciliar. Esse é aquele aspecto que eu sinto, e que poucos se calhar se apercebem. Naturalmente há muitos outros. A natação tem muita falta de apoios, seja por falta de visibilidade ou por vezes de resultados. Não consigo apontar a culpa a quem está de fora ou por dentro, mas custa-me ver que, uma modalidade que cerca de 75 por cento das pessoas praticam esteja assim. Quem não vai à piscina ou à praia habitualmente?

Actualmente nada pelo Sporting, um clube Português. O que é que encontra lá fora que os clubes angolanos não têm?

Competitividade. Seja no treino ou nas competições. Em Angola, apenas os atletas que se encontrem fora, como eu, são competitivos. Pela experiência, um pouco à distância, que tenho, nem sei se por falta de apoios. Vejo muitas lacunas em várias camadas, a começar pela estrutura dirigente, passando pelos treinadores, e acabando nos próprios atletas. Temos que ser mais ambiciosos, para daqui a uns largos anos podermos evoluir significativamente. Nestes últimos oito anos, creio que estamos globalmente estagnados.

Como analisa a actual fase da natação angolana?

Como referia anteriormente, não posso referir que a natação esteja globalmente bem. Como em tudo, tem altos e baixos, atletas que se destacam mais do que outros, e resultados que aqui ou ali aparecem. Mas continuamos longe do que eu, realisticamente, gostava e sentia que poderíamos estar. Como atleta, sempre tentei trazer qualidade, motivação e ambição para as piscinas, e espero continuar a trazer, esteja dentro ou fora delas. E cada vez menos tenho dúvidas, é por cima que os exemplos devem vir. Sobretudo numa modalidade com praticantes tão jovens.

Desde 2008 que nada por Angola. Como surgiu a oportunidade para representar a nossa selecção?

Comecei em Abril de 2008, no Campeonato do Mundo de Piscina Curta em Manchester, Inglaterra. Surgiu pelas boas épocas no escalão júnior que realizei, alcançando inclusive, diversos recordes absolutos. E, quando em Setembro de 2007 ingressei no Sporting, dei um salto qualitativo considerável. A partir daí, estive presente em todas as competições internacionais, que foram aparecendo. Já lá vão oito anos...

E o que significa para si representar as cores angolanas?

Significa representar o país onde nasci, e uma cultura na qual cresci. É uma honra representar Angola. Somos um país lutador, e ao mesmo tempo um povo alegre, e com pensamento positivo. Identifico-me com esses ideais, e em cada prova faço o meu melhor, para levar sempre a nossa bandeira mais alto. Com o tempo, aprendi que clubes podemos trocar em função do destino e das vicissitudes, mas a nação que representamos, essa tem de estar sempre no coração.

Como concilia as competições do seu clube com as competições da selecção?

Como disse, é uma tarefa muito complicada. Tento estar bem, quer pelas principais provas dos clubes, quer na selecção, e isso por vezes implica esforço e cansaço adicional. Aprendi a gerir à minha maneira todas as solicitações. O facto de ser desde 2008 capitão de equipa do Sporting traz-me responsabilidades acrescidas. Ou talvez não, porque sempre fui um atleta disciplinado e que privilegia muito o exemplo que é transmitido aos colegas de equipa. Orgulho-me muito do meu percurso, nessa óptica colectiva: no Sporting somos pentacampeões nacionais, algo inédito.

Foi a segunda vez que se apurou para os Jogos Olímpicos. Qual a sua expectativa? O que podemos esperar da natação nas Olimpíadas do Brasil?

A expectativa é que consiga atingir o objectivo a que me propus. Bater o recorde nacional absoluto e, se possível, melhorar a classificação que obtive em Londres 2012. Para além disso, como competidor que sou, vou tentar vencer tantos quantos consiga. Este ano já irei com a experiência de 2012, e espero que isso ultrapasse as habituais dificuldades que sempre encontramos na nossa preparação, este ano agravadas com a actual conjuntura económica...

Qual é o seu maior sonho como nadador profissional?

Ser campeão africano. É um sonho, mas já esteve mais longe, e enquanto puder vou lutar por ele. Felizmente, nestes largos anos de natação, sempre fui um atleta feliz com as suas conquistas. E isso será sempre o mais importante.

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