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Marinela Chipepe, uma mulher no meio do mar

O despertador de Marinela Chipepe toca, invariavelmente, às 06h00. É assim, todos os dias, durante três semanas seguidas, sem falhar um único dia. Uma hora mais tarde, já com o pequeno-almoço tomado, apanha o barco que a conduz até uma das plataformas do Bloco 3. Seguem-se 12 horas de trabalho, com pequenas pausas, mas desgastantes do ponto de vista físico e intelectual.

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“Na plataforma o trabalho requer energia, concentração, força física e disposição. Nós trabalhamos com produtos químicos, com equipamentos pesados, fluidos de altas pressões e temperaturas muito elevadas. Tudo num ambiente em que todos têm de se preocupar ao máximo com a segurança, pessoal, da equipa e da estrutura”!

Esta engenheira mecânica e de petróleos, pertencente aos quadros da Sonangol, Pesquisa & Produção, formou-se na Universidade de Manchester, por influência do pai que sempre desejou que as filhas se tornassem autónomas nem que fosse numa “profissão mais indicada para homens”. Marinela Chipepe rejeita por isso qualquer tentativa de, por ser mulher, se minimizar o seu esforço e capacidade para trabalhar numa plataforma “offshore”.

“Se estamos todos no mesmo barco, homens e mulheres, é porque não há diferenças, certo?”, sublinha Marinela, que já se habituou a nem sequer ouvir um ou outro comentário mais masculino. “Como profissional sou extremamente rigorosa e acho que isso tem a ver com a condição feminina porque no nosso quotidiano somos obrigadas a gerir muito bem o que fazemos”, afirma com um ar resoluto.

 De colega a professora de inglês no offshore

Marinela Chipepe nasceu em Angola mas, com poucos meses, seguiu para Washington DC onde cresceu, com o inglês a fixar-se como sua língua nativa. Em 2009, depois de ter passado pela Namíbia, uma bolsa da Sonangol permitiu-lhe estabelecer-se na cidade inglesa de Manchester onde concluiu o ensino médio e fez a licenciatura em engenharia mecânica e de petróleos. “A universidade de Manchester foi a primeira na Europa a ter este curso e eu fui reconhecida como a primeira africana a licenciar-me nesta especialidade e logo com nota máxima” diz, orgulhosa.

Além dos conhecimentos técnicos, os anos passados nos Estados Unidos e Inglaterra conferiram-lhe total fluência na língua inglesa, pelo que foi desafiada a dar aulas de inglês aos colegas que estão consigo no offshore. Diariamente, entre as 20h00 e as 21h00, Marinela despe o fato de mecânica e assume o papel de professora. “O que me deixa mais feliz é constatar como o número de alunos tem aumentado em tao pouco tempo. É porque estão a gostar! Dou aulas aos meus compatriotas angolanos e a expatriados, que são, na esmagadora maioria, de nacionalidade francesa”.

Com tudo isto, o dia no offshore é longo, muito longo. “O descanso não é nosso amigo” diz, a rir. “Quando tenho algum tempo livre aproveito para ler mas, sobretudo, para relaxar e repousar”.

As mulheres no offshore

Após 21 dias passados no campo e nas plataformas do Bloco 3, Marinela Chipepe, passa um período idêntico – três semanas – em casa, sem trabalhar. Mas é complicado alterar este ciclo biológico.

“É difícil sim, e muito puxado! Sempre que regressamos à nossa vida onshore, em casa, com a família, com os amigos, há uma dificuldade de nos enquadrarmos num “novo” estilo de vida. O que acaba por suceder é que quando estou em casa adopto os mesmos horários que utilizo no campo. Claro que sempre dá para matar saudades da família, das pessoas que nos querem bem, recebemos sempre um consolo que não existe no trabalho. Mas os horários acabam por ser sempre os mesmos”.

A vida no offshore afecta a vida familiar, mas para Marinela a actividade profissional não é impeditiva de, no futuro, constituir uma família. Solteira e sem filhos, a sua principal atenção incide no desenvolvimento e evolução da sua actividade profissional, “quero ficar cinco anos no offshore… e depois então logo promete pensar, a sério, em marido e filhos.

Apesar de ainda não ser muito frequente em Angola, o número de mulheres a trabalhar em offshore aumentou de forma significativa nos últimos anos em África. Para Marinela é tudo uma questão de se quebrarem barreiras, profissionais e mentais: “Eu não acredito em barreiras profissionais. Hoje investe-se muito mais na capacidade profissional da mulher. Eu vejo a mulher como o ser mais forte que Deus criou. É verdade que as mulheres que trabalham em offshore sofrem, por vezes, certos preconceitos como nos apontarem a fragilidade física. Mas isso, na realidade, torna-me mais forte”!

 Marinela Chipepe ambiciona tornar-se numa engenheira de produção, na Sonangol ou, quem sabe, noutra grande multinacional petrolífera. “Além disso quero continuar a ser boa profissional e, futuramente, pretendo também casar e ser uma excelente mãe. Só uma mulher consegue fazer tudo isto” conclui com o sorriso firme com que enfrenta o dia-a-dia nas plataformas de petróleo.

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